Definição

... da totalidade das coisas e dos seres, do total das coisas e dos seres, do que é objeto de todo o discurso, da totalidade das coisas concretas ou abstratas, sem faltar nenhuma, de todos os atributos e qualidades, de todas as pessoas, de todo mundo, do que é importante, do que é essencial, do que realmente conta...
Em associação com Casa Pyndahýba Editora
Ano VI Número 63 - Março 2014

Conto - José Geraldo de Barros Martins

Em associação com Casa Pyndahýba Editora

Ano II Número 14 - Fevereiro 2010

Ilustração: José Geraldo de Barros Martins

A verdadeira estória de Josué Jamil

Na primeira vez que Josué Jamil viu um retrato de James Joyce, percebeu que os comentários eram reais... quais comentários??? os comentários que asseguravam que ele era um sósia perfeito do escritor irlandês... isto fez com ele, um reles escriturário, se interessasse pela obra de um renomado escritor e também passasse a se vestir como tal... gostou de tudo que leu (até de Finnegans Wake., por incrível que pareça...), mas para ele a melhor obra de Joyce era “Ulisses”, romance que se passa em apenas um dia no qual há um paralelo entre a estória narrada (no caso o cotidiano de um corretor de anúncios chamado Leopold Bloom) e a epopéia de Homero, significando que um simples dia no nosso cotidiano pode ser tão intenso ou significativo quanto uma epopéia...

Mas por mais que Josué Jamil tivesse gostado de “Ulisses” ele achava que estava faltando algo... o que??? ele não sabia o que era, mas sabia que estava faltando alguma coisa e achou que se passasse a ler os outros grandes autores ele iria descobrir... então ele começou a ler... a ler vários autores.... quais autores ??? Machado, Melville, Goethe, Homero, Shakespeare, Dante, Cervantes, Blake, Borges, Baudelaire, Poe, Pessoa, Eliot, e vários outros, mas ao ler Camões é que Josué Jamil teve o estalo... qual estalo ??? simplesmente ele percebeu que “Os Lusíadas” era a primeira epopéia moderna, e que o grande erro de “Ulisses” era o fato de Joyce ter não usado a obra de Camões como base para seu livro revolucionário, mas utilizado “A Odisséia”, ou seja, utilizado uma epopéia antiga como fundo para uma estória que ocorre em 16/06/1904... o melhor, seria se Joyce tivesse se baseado em uma epopéia moderna, no caso “Os Lusíadas”...

“- Já sei !!!” pensou... “Vou escrever um livro baseado na epopéia de Camões!!!”

Da mesma forma que James Joyce intitulou seu livro com o nome do herói (“Ulisses)” de uma epopéia (“Odisséia”), Josué Jamil pensou em entitular seu livro com o nome do herói de “Os Lusíadas”, no caso: “Vasco da Gama”...

Mas havia um problema...qual problema??? Josué Jamil era são-paulino doente, (se vestia sempre com uma gravata no padrão da camisa do clube e usava exageradamente um anel com o distintivo do clube), sendo que não tinha boas recordações da final do campeonato brasileiro de 1989 (em que o tricolor paulista perdeu para a equipe cruz-maltina), de modo que a nova obra, a que iria revolucionar definitivamente a literatura, jamais poderia se chamar “Vasco da Gama”... “- Depois eu coloco o título.” pensou o nosso protagonista, na verdade ele ainda não sabia nem sobre o que escrever... pensou, pensou e pensou... e descobriu... descobriu o que??? descobriu que deveria escrever um romance autobiográfico e que o evento mais significativo para ele havia sido a final do mundial interclubes de 1992 ... logo o romance deveria se passar somente em um dia, mais precisamente na data do jogo entre São Paulo X Barcelona em 12/12/1992... um pouco de tempo depois o nosso protagonista descobriu algumas outras analogias... quais analogias??? analogias complexas demais para serem explicadas detalhadamente neste breve relato, mas analogias entre “Os Lusíadas” e o jogo de futebol retro-mencionado...

O Lusíadas estão dividos em quatro partes: proposição (Canto I: 1-3), invocação (Canto I: 4-5), dedicatória (Canto I: 6-18) e narração (Canto I: 19 até o final :144), sendo que a entrada dos times em campo seria uma analogia da “proposição”, os times cantando o hino seriam uma analogia da “invocação”, a partida seria uma analogia da “narrativa” e os vencedores recebendo os troféus seriam uma analogia da “dedicatória”... Se analisarmos atentamente a partida veremos como ela se assemelha a narrativa... o gol do búlgaro Stoitchkov aos 12 minutos seria uma analogia da emboscada que os mouros moçambicanos armaram contra os portugueses no final do Canto I, o gol de empate de Raí após a bela jogada de Muller aso aos 27 minutos do primeiro tempo seria uma analogia da chegada de Vasco da Gama a Calicute no início do Canto VII, e o gol da vitória na perfeita cobrança de Raí seria uma analogia do episódio no Canto X em que Vasco da Gama contempla a Máquina do Mundo...

Logo o romance de Josué Jamil estava estruturado...mas como é que estava estruturado??? seria uma narrativa da primeira vez que um jovem de Jundiaí iria a região da 25 da de Março no centro de São Paulo, lá ele compraria incensos e outros artigos indianos para a sua namorada, depois se dirigiria para o Mercadão onde compraria um litro de azeite português (para sua mãe) e uma garrafa de um licor de ervas catalão (para o seu pai), no retorno a sua cidade natal se encontraria com um amigo na rodoviária local onde assistiriam a final do Mundial de Interclubes na TV de um boteco próximo... e ao chegar em casa encontraria sua namorada dormindo , vestida com um pijama em que a palavra SIM estaria estampada no peito... cada episódio da narrativa teria uma contrapartida nos “Os Lusíadas”, e também uma outra contrapartida na referida partida de futebol, havendo inclusive 23 personagens correspondentes aos 23 jogadores que disputaram a peleja... a questão que faltava era o nome do livro... e sabem qual o nome escolhido??? a obra iria se chamar “Raigama” ... e o que significava esta palavra??? era um neologismo que misturava o nome do capitão do escrete tricolor com o sobrenome do navegador português...

Depois de sete anos, o livro ficou pronto, onde a estória ocupava um pouco mais de cem páginas, enquanto que o apêndice explicando detalhadamente as analogias retro-mencionadas possuia cerca de quatrocentas páginas... Josué Jamil levou os originais do livro a diversos editores, que sempre recusavam a publicação desta obra complicada... até que conseguiu publicá-la... mas conseguiu como??? ora, depois de tentar em vários locais ele procurou Louis Monterrey, o rei do Marketing Editorial... Louis após ouvir a sinopse da obra e folheá-la por alguns minutos, disse o seguinte:

“- Meu amigo, esqueça esta idéia de querer fazer um “Ulisses” melhorado, um livro não pode ser aperfeiçoado, uma obra-prima então, nem pensar... um livro não é como um automóvel que é aperfeiçoado ano após ano... um livro é um livro, apenas... faça o seguinte: jogue fora este chapéu e esta bengala ridícula, você é o Josué Jamil e não o James Joyce!!! em seguida raspe a cabeça e passe a se vestir com uma túnica branca... então aí poderemos publicar o livro, mas terei que fazer duas modificações...”

“ - Mas você não pode mexer no texto,!!! Isto eu não permito!!!” respondeu o nosso protagonista...

“ - Mas quem disse que eu vou mexer no texto??? nada disso... só vamos substituir este enorme apêndice explicativo por um prefácio adequado e mudar a ortografia do título... só isto!!!”

O que dizia o prefácio??? dizia que aquela estória era universal pois se tratava da analogia de uma iniciação espiritual (por isso que o título era indiano, apesar da estória se passar no centro de São Paulo e em Jundiaí) e que todo cidadão que a lesse se tornaria uma pessoa diferente porque esta estória poderia acontecer com qualquer um de nós...

Hoje Josué Jamil é um escritor realizado... seu livro de estréia “Rayghama” com um belo prefácio de Luigi Montessori (um dos pseudônimos de Louis Monterrey), foi o primeiro de uma série de obras de enorme sucesso editorial (todas com nomes indianos, ou melhor, pseudo-indianos)... ele parou de comer carne e de beber (pelo menos em público, é claro) e com a cabeça raspada, a túnica branca a as sandálias de couro, aparenta ser um autêntico mestre espiritual... a única coisa que destoa em seu visual é o inseparável anel com o distintivo de clube de futebol...

José Geraldo De Barros Martins nasceu em São Paulo, neto do editor José de Barros Martins da parte paterna e sobrinho-neto do poeta Oliveira Ribeiro Neto por parte materna. Formado pela Faculdade de Arquitetura e Urbanismo na Universidade de São Paulo, atualmente trabalha com projetos de sinalização viária e engenharia de tráfego. Estudou violão e guitarra e antes de ingressar na universidade foi integrante do lendário grupo "Dentro do Piano", do qual participaram Paulo Padilha (ex-integrante do Aquilo Del Nisso), Sérgio Molina e Sidney Molina (integrante do grupo Quaternália). Compôs e executou (em parceria com o percursionista Mário Eugênio Cintra Ferreira) a trilha sonora do curta-metragem "Experience Tupiniquim In London" do diretor José Reynaldo. Como pintor expôs no Centro Cultural São Paulo, na estação de Metrô Consolação, na Galeria Aliançe Francaise e na sala Funarte entre outros locais. Estudou Cabala e praticou yoga, hoje lê os clássicos e pratica boxe. É casado e não tem filhos. Sãopaulino. Desde 2001 publica seus desenhos e escritos no blog http://zegeraldo.free.fr.

1 comment:

Anonymous said...

bacana também na segunda leitura. o primeiro parágrafo tem a melhor definição de ulisses que eu já vi. paulo francis ia gostar das outra sínteses também.

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