O Retrato do Sertão – 4
O sol forte e indolente se escondeu no horizonte levando mais um dia da esperança do sertanejo, enquanto implorou e rezou pela chuva que não veio. Já estamos no mês de julho e a vontade de Deus, mercê das procissões e novenas com a imagem de São José subtraída às escondidas da igreja, não trouxe chuva. O jeito era esperar por mais um ano.
A “faveira” de vagens robustas e nutritivas era a única fonte de alimento que restava. Sua folhagem abundante e esparsa serve para o sertanejo abrigar-se do sol quente enquanto alimenta o rebanho faminto, às vezes a própria família. O juazeiro ainda ostenta suas folhas verdes desafiando a seca bravia. O imbuzeiro e o mandacaru persistem com sua robustez, aliciar a fome do rebanho que se aviltam ao sol causticante. Alhures via-se raras espécies de aroeiras com galhos secos iniciando a florada. O carimã que Mãe Crisalda preparou com esmero, já se encontrava sobre a mesa de madeira rústica para deleite dos convidados.
- Geraldina, não vai... fica... implorou a cunhada, pedindo para que ela ficasse na festa de batizado de Agapito.
- Não posso, Giselda... o Tonho ficou de me apanhar aqui logo mais. Já combinamos... e além do mais, não quero me encontrar com Sá Lorena, aquela intrusa e mexeriqueira. Você bem sabe que não gosto dela. Quem mandou convida-la?
- Ninguém a convidou, ela é que é intrometida! Ela ficou sabendo da festa no armazém de Maninha e disse que vinha. O que posso fazer?
- Tudo bem, Giselda, disse Geraldina um tanto chateada. Depois do sarau de dona Elvira eu e o Tonho passaremos por aqui, tá bom?
- Esperamos!
A desculpa que Geraldina dera era mais do que satisfatória e sincera, porém, desconfortante por não poder participar do batizado do sobrinho.
Giselda sabia dos entreveros que Geraldina tivera com Sá Lorena e não desejava que se repetisse, ainda mais na festa de batizado do seu filho.
Geraldina colocou uma muda de roupa no alforje, montou na garupa da mula que Tonho cavalgava e se foram, antes da chegada de Sá Lorena e Seu Juvenal.
Ruídos de cavalgadas ouviam-se à distância, enquanto a canjica, o bolo de fubá e a broa eram feitos por Marilda e Marilena.
Agamenon e seus irmãos, Seu Quincas, Mãe Crisalda, Maninha e seu filho Zequinha e outros que já haviam chegado aguardavam no terreiro. O fogo ardia incessantemente, às vezes impedindo o brilho das estrelas pela fumaça que fazia. Mas nada disso era motivo para atrapalhar a festa de batizado de Agapito.
Sobre o carvão candente espigas de milho verde aguardavam o momento de serem consumidas. Esperavam por Sá Lorena e seu marido, que sem o consentimento de Giselda, estavam à caminho.
De repente alguém gritou lá da porteira.
-Sá Lorena e Seu Juvenal estão chegando!
- Apeiem-se e se acheguem, disse Agamenon, com gesto toste e um sorriso disforme a denunciar-lhe a falta de alguns dentes.
Sá Lorena e Seu Juvenal apearam. Enquanto ela se dirigia ao terreiro para juntar-se aos demais convidados, ele amarrava o cavalo num pequeno tronco de oiti ao lado da casa. Cumprimentaram o pessoal e se sentaram.
Sá Lorena que a tudo observava, logo foi perguntando por Geraldina.
– Cadê Geraldina?
- Ela foi até a casa de Zeca Vaqueiro convidá-lo, mas logo estará de volta, respondeu Maninha, sabendo das intenções maldosas de Sá Lorena.
- Como vai Maninha, perguntou Seu Juvenal, antes mesmo de cumprimentar Mãe Crisalda, que revirava as espigas de milho, do outro lado da fogueira.
- Tô bem. Só o Zequinha que de vez em quando tem a mania de querer ir embora pra São Paulo... isso me entristece e me aperreia. O pai não fala nada... quando diz alguma coisa, pede pra eu deixar de ser besta porque é melhor pra ele. Em São Paulo arruma emprego, estuda e pode se tornar alguém na vida.
- Tá certo o Leonildo mulher, deixe de ser tonta! Interrompeu Sá Lorena, curiosa pra querer saber de mais detalhes.
- Mas, Seu Juvenal eu fico cá com meus miolos queimando de aflição, respondeu Maninha ignorando a intervenção de Sá Lorena.
- Tem que deixar mesmo Maninha, se for para o bem dele, interrompeu Seu Quincas, que se aproximava do grupo sob o olhar reprovativo de Sá Lorena, com quem tivera algumas desavenças no passado, sobre invasão de terras.
Com a chegada de Agamenon, que trazia a cuia de mandioca e algumas espigas de milho assadas, a conversa se encerrou e todos se perfilaram ao redor da fogueira.
Cada um pegou seu par para dançar e pular o braseiro, menos Agamenon e Giselda ,que serviam os convidados. Pularam por três vezes ao redor da fogueira dando vivas a São João. Depois aclamarem os padrinhos de Agapito, foi a vez de Mãe Crisalda pular o braseiro com Giselda e Agamenon que trazia o filho nos braço, pedindo para que São João os abençoassem como compadres.
Estava batizado o filho de Agamenon que Nhá Marina não conheceu.
O registro civil se daria dali a três meses ou mais, quando a chuva que tardou esse ano trouxesse fartura e alegria. A crisma seria feita quando padre Fausto passasse pela região.
Madrugou, e todos os convidados alegres pelo efeito da carimã se retiraram para suas casas. Conversando no oitão, deitados na rede tecida de algodão e fumando cigarro de palha, ficaram apenas Agamenon e Agaciel à espera de Geraldina que tardava chegar.
A “faveira” de vagens robustas e nutritivas era a única fonte de alimento que restava. Sua folhagem abundante e esparsa serve para o sertanejo abrigar-se do sol quente enquanto alimenta o rebanho faminto, às vezes a própria família. O juazeiro ainda ostenta suas folhas verdes desafiando a seca bravia. O imbuzeiro e o mandacaru persistem com sua robustez, aliciar a fome do rebanho que se aviltam ao sol causticante. Alhures via-se raras espécies de aroeiras com galhos secos iniciando a florada. O carimã que Mãe Crisalda preparou com esmero, já se encontrava sobre a mesa de madeira rústica para deleite dos convidados.
- Geraldina, não vai... fica... implorou a cunhada, pedindo para que ela ficasse na festa de batizado de Agapito.
- Não posso, Giselda... o Tonho ficou de me apanhar aqui logo mais. Já combinamos... e além do mais, não quero me encontrar com Sá Lorena, aquela intrusa e mexeriqueira. Você bem sabe que não gosto dela. Quem mandou convida-la?
- Ninguém a convidou, ela é que é intrometida! Ela ficou sabendo da festa no armazém de Maninha e disse que vinha. O que posso fazer?
- Tudo bem, Giselda, disse Geraldina um tanto chateada. Depois do sarau de dona Elvira eu e o Tonho passaremos por aqui, tá bom?
- Esperamos!
A desculpa que Geraldina dera era mais do que satisfatória e sincera, porém, desconfortante por não poder participar do batizado do sobrinho.
Giselda sabia dos entreveros que Geraldina tivera com Sá Lorena e não desejava que se repetisse, ainda mais na festa de batizado do seu filho.
Geraldina colocou uma muda de roupa no alforje, montou na garupa da mula que Tonho cavalgava e se foram, antes da chegada de Sá Lorena e Seu Juvenal.
Ruídos de cavalgadas ouviam-se à distância, enquanto a canjica, o bolo de fubá e a broa eram feitos por Marilda e Marilena.
Agamenon e seus irmãos, Seu Quincas, Mãe Crisalda, Maninha e seu filho Zequinha e outros que já haviam chegado aguardavam no terreiro. O fogo ardia incessantemente, às vezes impedindo o brilho das estrelas pela fumaça que fazia. Mas nada disso era motivo para atrapalhar a festa de batizado de Agapito.
Sobre o carvão candente espigas de milho verde aguardavam o momento de serem consumidas. Esperavam por Sá Lorena e seu marido, que sem o consentimento de Giselda, estavam à caminho.
De repente alguém gritou lá da porteira.
-Sá Lorena e Seu Juvenal estão chegando!
- Apeiem-se e se acheguem, disse Agamenon, com gesto toste e um sorriso disforme a denunciar-lhe a falta de alguns dentes.
Sá Lorena e Seu Juvenal apearam. Enquanto ela se dirigia ao terreiro para juntar-se aos demais convidados, ele amarrava o cavalo num pequeno tronco de oiti ao lado da casa. Cumprimentaram o pessoal e se sentaram.
Sá Lorena que a tudo observava, logo foi perguntando por Geraldina.
– Cadê Geraldina?
- Ela foi até a casa de Zeca Vaqueiro convidá-lo, mas logo estará de volta, respondeu Maninha, sabendo das intenções maldosas de Sá Lorena.
- Como vai Maninha, perguntou Seu Juvenal, antes mesmo de cumprimentar Mãe Crisalda, que revirava as espigas de milho, do outro lado da fogueira.
- Tô bem. Só o Zequinha que de vez em quando tem a mania de querer ir embora pra São Paulo... isso me entristece e me aperreia. O pai não fala nada... quando diz alguma coisa, pede pra eu deixar de ser besta porque é melhor pra ele. Em São Paulo arruma emprego, estuda e pode se tornar alguém na vida.
- Tá certo o Leonildo mulher, deixe de ser tonta! Interrompeu Sá Lorena, curiosa pra querer saber de mais detalhes.
- Mas, Seu Juvenal eu fico cá com meus miolos queimando de aflição, respondeu Maninha ignorando a intervenção de Sá Lorena.
- Tem que deixar mesmo Maninha, se for para o bem dele, interrompeu Seu Quincas, que se aproximava do grupo sob o olhar reprovativo de Sá Lorena, com quem tivera algumas desavenças no passado, sobre invasão de terras.
Com a chegada de Agamenon, que trazia a cuia de mandioca e algumas espigas de milho assadas, a conversa se encerrou e todos se perfilaram ao redor da fogueira.
Cada um pegou seu par para dançar e pular o braseiro, menos Agamenon e Giselda ,que serviam os convidados. Pularam por três vezes ao redor da fogueira dando vivas a São João. Depois aclamarem os padrinhos de Agapito, foi a vez de Mãe Crisalda pular o braseiro com Giselda e Agamenon que trazia o filho nos braço, pedindo para que São João os abençoassem como compadres.
Estava batizado o filho de Agamenon que Nhá Marina não conheceu.
O registro civil se daria dali a três meses ou mais, quando a chuva que tardou esse ano trouxesse fartura e alegria. A crisma seria feita quando padre Fausto passasse pela região.
Madrugou, e todos os convidados alegres pelo efeito da carimã se retiraram para suas casas. Conversando no oitão, deitados na rede tecida de algodão e fumando cigarro de palha, ficaram apenas Agamenon e Agaciel à espera de Geraldina que tardava chegar.
José Miranda Filho, ex-Presidente e fundador do PMDB em São Caetano do Sul, Venerável Mestre da Loja Maçônica G. Mazzini (grau 33), é advogado e contador, colabora com o jornal ABC Reporter e atua como Diretor Financeiro do Conselho Gestor do Hospital Benificente São Caetano. Posta no Blog do Miranda.
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