O Retrato do Sertão – 12
Virgulino não deu ouvidos aos conselhos de coronel Saturnino quando lhe pediu para não ir a Laranejeiras tratar do olho. A advertência que lhe fizera entendiou-o tanto, a ponto de mandá-lo a puta que o pariu várias vezes por causa das precauções que teria de ter para não se arriscar comparecer a lugares em que nunca estivera antes. Porém, Virgulino, homem extremamente corajoso, teimoso e vaidoso, queria provar sua popularidade.!
Ninguém era capaz de fazê-lo recuar de suas idéias, exceção apenas fazia a Corisco e mais dois cabras com os quais mantinha dedicação total.
Metade do povo de Laranjeiras o admirava pelo objetivo de sua luta, enquanto a outra metade se divida, entre odiá-lo, matá-lo ou prendê-lo.
Mesmo amparados nos momentos aflitivos da vida quando ele emprestava dinheiro ou ajudava no sustento de suas famílias, o sertanejo jamais acreditou em suas benesses. Julgavam - o violento demais e demasiadamente presunçoso pela causa que defendia.
Dias atrás ocorrera a notícia de que ele estaria na redondeza, escondido na fazenda de algum coronel coiteiro.
Saturnino temia ser processado e preso por lhe dar guarida e dificultar a ação policial. Várias vezes tentou persuadí-lo da idéia de se tratar em Laranjeiras. Traria doutor Brandão até sua fazenda. Mas, ele sempre resistia à idéia. Batia o pé, e dizia não temer ameaças de macaco nenhum, principalmente desse tal major Lucena que o chamou de covarde, incasto e incendiário de vilas e casas de sertanejos.
Na aporia da discussão que ambos tiveram, distratou Saturnino chamando-o de comborço, complascente, corruto e covarde.
Saturnino ouvia tudo silenciosamente....Acabrunhado e temeroso nada respondia.
Lampião queria testar sua coragem e lealdade.
- Meus conselheiros já fizeram a varredura do local, compadre! Já se certificaram de tudo. Fique tranquilo! Não tenho o que temer das ameaças do major Lucena. Posso ir à Laranjeiras sem perigo algum quanto à minha segurança. Irei de qualquer jeito. Já decidi. Irão comigo apenas meus três fiéis companheiros.
Quanto à segurança e de seus homens, Virgulino sempre fora cauteloso. Não aceitava, porém, conselhos de quem quer que fôsse. Tão sòmente ouvia seu Estado-Maior, com os quais se reunia frequentemente. Repudiava veementemente quaisquer advertências que lhe faziam os compadres e coiteiros, principalmente esses de quem sempre desconfiou, porque um dia, certamente, sería traído por algum deles.
Seu desejo, entretanto, era mostrar ao povo de Laranejiras que não temia ameaças. Queria ser recebido com ovação, porém seus conselheiros, não concordando com suas idéias conseguiram persuadir-lhe, e a recepção se transformou numa simples visita ao médico, sem que sua presença fosse notada na cidade.
− Não aceito que alguém me diga o que fazer ou deixar de fazer, compadre! Ouço e aceito às vezes o que me dizem Corisco, Faísca e Zé Bedeu, meus únicos amigos leais de quem tenho absoluta confiança. Tenho informações confiáveis deles que a cidade está tranquila, mas acatei seus argumentos: Iremos sem pompas.
Na madrugada do dia seguinte Lampião partiu para Laranjeiras, deixando Saturnino aliviado de uma possível invasão policial à sua fazenda.
Um detalhe importante, contudo, foi esquecido por seus conselheiros: Desde o fracassado seqüestro do Coronel Antonio Gurgel, a Polícia seguia e mapeava seus passos. Possuía informações confidenciais dos lugares pelos quais passava e onde se escondia. Para capturá-lo, dependia apenas da liberação de verbas federais, a fim de organizar a expedição, cujo tempo demandaria semanas ou meses, cavalgando pelo sertão.
Convalecendo-se da operação do olho na fazenda de coronel José Pereira Lima nos arredores de Anjicos, Virgulino parecia sentir-se confortável e seguro. Jamais estivera antes mais de um dia no mesmo lugar. Estratégia que sempre usava e seguia à risca para despistar seus persseguidores. Mas, a exceção, talvez devido ao estado de saúde, fora sua inimiga cruel.
− Bom dia, patrão! Cumprimentou Zé Vaqueiro nervoso, à porta da casa rodeada de azaléias que Celestina plantava e cuidadosamente religiosamente.
Mal humorado, após uma noite mal dormida por devaneios terríveis, a ponto de dona Celestina ter interrompido o sono várias vezes para lhe preparar o chá de maracujá, coronel Saturnino respondeu insipidamente:
− Bom dia, Zé...Tá nervosos? ...Tá com medo de quê?
− Oia, seu Coroné, medo eu nunca tive, mas de vez em quando a gente sofre uns arrepios no corpo que dá prá assustar. As notícias que veem da cidade não são boas. O Chiquinho me contou esta manhã enquanto o senhor dormia, que capitão Virgulino foi cercado pela federal na fazenda de coronel Zé Pereira. Ele não me deu maiores detalhes, mas me disse que foi um tiroteio intenso e que se salvaram apenas alguns cabras, que já estão presos. Não soube me dizer quantos foram, apenas que foi uma carnificina. Na opinião dele mataram Virgulino, Maria Bonita e uns quinze ou vinte cabras, e mais uns dez ou quinze do coronel Zé Pereira. O terreiro da fazenda mais parece um rio de sangue. Tem defunto espalhado prá todo canto. Me disse que arrancaram as cabeças de Lampião e Maria Bonita, botaram numa lata de querozene com cal e sal e levaram para Sergipe. Acho melhor o senhor ir até Laranjeiras se informar melhor dos acontecimentos. Chiquinho estava muito nervoso. Me disse que padre Fausto já estava a caminho do gabinete do prefeito junto com outros coronéis.
− E, como foi isso, Zé? Como tudo aconteceu?...Como ele soube desse tiroteio? Lampião passou por aqui ontem aqui.. como...
Inpaciente, sem saber que rumo tomar, Saturnino andava de um canto ao outro do alpendre, até que Zé o convenceu ir à cidade.
− Tá bom, Zé. Vamos pra Laranjeiras. Mas, tem que ser agora. Vá arrear os cavalos. Traga o rifle, meu revolver e a cartucheira cheia.
Celestina ficou apreenssiva. Não queria ver marido envolvido mais do que esteve na noite anterior, quando deu abrigo a Lampião, e se aventurasse numa viagem dessas sem ao menos ter noticias mais confiáveis. Poderia ser uma emboscada, como já acontecera tempos atrás, ou até ser preso por ter lhe dado abrigo... Temia pelo marido.
A cidade de Laranjeiras era um alvoroço só naquela manhã ensolarada e quente. Mais parecia dia de eleição, de tanta gente reunida ao entorno da prefeitura, cujo prédio também abrigava o Fórum, a Câmara de vereadores e a cadeia pública.
A multidão aguardava ansiosa o pronunciamento do prefeito que mandara um emissário até a fazenda de Zé Pereira para se informar dos acontecimentos. Todos estavam todos ávidos por notícias e saber quem havia denunciado Lampião... Como fora capturado...Onde fora encontrado...E, se realmente o haviam matado.
Coronel Saturnino apeou do cavalo em frente ao prédio do Paço municipal e se dirigiu imediatamente ao gabinete do prefeito, aonde já se encontravam vários líderes locais. Lá estavam alguns coronéis coiteiros, chefes de partidos políticos, padres, o emissasário de padre Cicero e outras autoridades menos importantes do Estado. Cumprimentou-os a todos e seguiu diretamente para o adro do paço observar a multidão que aguardava por informações.
No meio da multidão estava Sá Lorena, ao lado do marido..
No gabinete do prefeito, os líderes do alto comando udenista aguardava o retorno do menssageiro.
− Prefeito, o senhor já tem algumas notícias para nos adiantar? Perguntou coronel Saturnino, enquanto pendurava o chapéu de couro no cabideiro, logo abaixo do retrato do governador do Estado.
- Até agora sabemos pouca coisa, coronel. Apenas que Lampião e sua mulher foram mortos e seus corpos enviados para Sergipe. Segundo me disse esta manhã o empregado de Jeremias quando voltava para casa. O tiroteio durou uns vinte minutos.
- Já temos notícias que lá em Sergipe, estão tentando incriminar o coronel José Pereira Lima, e denunciá-lo por crime de acoitamento e por ter dificultado a ação da polícia. A coisa pode ficar feia para o nosso lado também, coronel.
- Tomemos cuidado, companheiros, disse temeroso.
Reunida na praça principal a multidão impaciente pedia por notícias. Aguns desaforados baderneiros iniciaram um tumulto, mas a polícia mesmo em número reduzido de homens pôde contê-los.
− Será que foi seu Quincas quem denunciou Lampião e recebeu o dinheiro da recompensa? Perguntava Sá Lorena aos curiosos ao seu redor, demonstrando alegria que estampava no rosto envelhecido pelas rugas.
− Não, foi Agaciel quando veio buscar doutor Brandão para examinar o pai, respondeu a secretária, também curiosa e arrempedida de ter dito que Virgulino estivera no consultório no dia anterior.
− Não foi Agaciel, disse alguém ao lado. Foi o próprio Ze Pereira.
Na verdade, ninguém sabia dos fatos.
Tentando ultrapassar o cordão de isolamento e chegar ao gabinete do prefeito, padre Fausto avistou-se com Sá Lorena, e insipidamente lhe disse:
− Está satisfeita agora, bruxa?
− Não lhe respondo com raiva. Não me interessa saber de sua preocupação. O senhor é que deve responder pelos seus atos. Seu passado...Sua fama...Apenas eu gostaria de saber quem foi o herói que dedurou este cafajeste!. O senhor que se cuide, padre! A coisa pode piorar para o seu lado. Os boatos se espalham...E eu...
A gritaria da multidão impediu que Sá Lorena completasse sua insatisfação.
− Foi coronel José Pereira, gente!. Gritou o açogueiro do outro lado da multidão! Eu trabalhei muitos anos prá ele. Ele nunca foi confiável. Sempre foi covarde e traiçoeiro.
− Olha, acredito no Zé açougueiro, disse Dona Cleusa, uma senhora católica e assídua frequentadora de reuniões políticas no gabinete do prefeito.
− Só pode ter sido mesmo Zé Pereira quem dedurou Lampião, disse Ernestino, um honem de baixa estatura e franzino que já havia trabalhado prá ele colhendo milho. É um homem sem caráter, desleal, e acima de tudo interesseiro, mão de vaca e avarento. Não paga pra quem trabalha pra ele. Vende a própria alma ao Diabo por dinheiro. É um miserável.
Todos concordaram com Ernestino e Zé açougueiro. Sabiam que o capitão Virgulino Ferreira estava escondido na fazenda de Zé Pereira, convalescendo-se da cirurgia do olho após ter passado pela fazenda de Saturnino.
Coronel Saturnino, homem forte na região, político influente, amigo e correligionário do governador do Estado, temia o que podería lhe acontecer. Entre tantos amigos, de quem tería ajuda, se necessário fosse provar sua inocência, contaria com o juiz de Direito de Angicos, o delegado da cidade de Laranjeiras, o Major Lucena, comandante da Policia Militar, padre Fausto, o bispo Don Francisco, padre Cícero, figuras respeitadíssimas, e tantos outros cidadãos influentes do Estado de Alagoas.
Coronel Saturnino permaneceu o dia toso em Anjicos. Pousou na fazenda do coronel Amâncio, outro coiteiro e amigo, com quem dividiu suas preocupações. Bebeu cachaça a noite inteira para aliviar-se da incômoda situação em que se encontrava.
Finalmente, na tarde do dia seguinte, após confirmadas as notícias da morte de Lampião e su a mulher, voltou para a fazenda. Armou seu bando, e pôs-se de prontidão a fim de se acautelar e prevenir-se de qualquer investida da polícia militar.
Virgulino não deu ouvidos aos conselhos de coronel Saturnino quando lhe pediu para não ir a Laranejeiras tratar do olho. A advertência que lhe fizera entendiou-o tanto, a ponto de mandá-lo a puta que o pariu várias vezes por causa das precauções que teria de ter para não se arriscar comparecer a lugares em que nunca estivera antes. Porém, Virgulino, homem extremamente corajoso, teimoso e vaidoso, queria provar sua popularidade.!
Ninguém era capaz de fazê-lo recuar de suas idéias, exceção apenas fazia a Corisco e mais dois cabras com os quais mantinha dedicação total.
Metade do povo de Laranjeiras o admirava pelo objetivo de sua luta, enquanto a outra metade se divida, entre odiá-lo, matá-lo ou prendê-lo.
Mesmo amparados nos momentos aflitivos da vida quando ele emprestava dinheiro ou ajudava no sustento de suas famílias, o sertanejo jamais acreditou em suas benesses. Julgavam - o violento demais e demasiadamente presunçoso pela causa que defendia.
Dias atrás ocorrera a notícia de que ele estaria na redondeza, escondido na fazenda de algum coronel coiteiro.
Saturnino temia ser processado e preso por lhe dar guarida e dificultar a ação policial. Várias vezes tentou persuadí-lo da idéia de se tratar em Laranjeiras. Traria doutor Brandão até sua fazenda. Mas, ele sempre resistia à idéia. Batia o pé, e dizia não temer ameaças de macaco nenhum, principalmente desse tal major Lucena que o chamou de covarde, incasto e incendiário de vilas e casas de sertanejos.
Na aporia da discussão que ambos tiveram, distratou Saturnino chamando-o de comborço, complascente, corruto e covarde.
Saturnino ouvia tudo silenciosamente....Acabrunhado e temeroso nada respondia.
Lampião queria testar sua coragem e lealdade.
- Meus conselheiros já fizeram a varredura do local, compadre! Já se certificaram de tudo. Fique tranquilo! Não tenho o que temer das ameaças do major Lucena. Posso ir à Laranjeiras sem perigo algum quanto à minha segurança. Irei de qualquer jeito. Já decidi. Irão comigo apenas meus três fiéis companheiros.
Quanto à segurança e de seus homens, Virgulino sempre fora cauteloso. Não aceitava, porém, conselhos de quem quer que fôsse. Tão sòmente ouvia seu Estado-Maior, com os quais se reunia frequentemente. Repudiava veementemente quaisquer advertências que lhe faziam os compadres e coiteiros, principalmente esses de quem sempre desconfiou, porque um dia, certamente, sería traído por algum deles.
Seu desejo, entretanto, era mostrar ao povo de Laranejiras que não temia ameaças. Queria ser recebido com ovação, porém seus conselheiros, não concordando com suas idéias conseguiram persuadir-lhe, e a recepção se transformou numa simples visita ao médico, sem que sua presença fosse notada na cidade.
− Não aceito que alguém me diga o que fazer ou deixar de fazer, compadre! Ouço e aceito às vezes o que me dizem Corisco, Faísca e Zé Bedeu, meus únicos amigos leais de quem tenho absoluta confiança. Tenho informações confiáveis deles que a cidade está tranquila, mas acatei seus argumentos: Iremos sem pompas.
Na madrugada do dia seguinte Lampião partiu para Laranjeiras, deixando Saturnino aliviado de uma possível invasão policial à sua fazenda.
Um detalhe importante, contudo, foi esquecido por seus conselheiros: Desde o fracassado seqüestro do Coronel Antonio Gurgel, a Polícia seguia e mapeava seus passos. Possuía informações confidenciais dos lugares pelos quais passava e onde se escondia. Para capturá-lo, dependia apenas da liberação de verbas federais, a fim de organizar a expedição, cujo tempo demandaria semanas ou meses, cavalgando pelo sertão.
Convalecendo-se da operação do olho na fazenda de coronel José Pereira Lima nos arredores de Anjicos, Virgulino parecia sentir-se confortável e seguro. Jamais estivera antes mais de um dia no mesmo lugar. Estratégia que sempre usava e seguia à risca para despistar seus persseguidores. Mas, a exceção, talvez devido ao estado de saúde, fora sua inimiga cruel.
− Bom dia, patrão! Cumprimentou Zé Vaqueiro nervoso, à porta da casa rodeada de azaléias que Celestina plantava e cuidadosamente religiosamente.
Mal humorado, após uma noite mal dormida por devaneios terríveis, a ponto de dona Celestina ter interrompido o sono várias vezes para lhe preparar o chá de maracujá, coronel Saturnino respondeu insipidamente:
− Bom dia, Zé...Tá nervosos? ...Tá com medo de quê?
− Oia, seu Coroné, medo eu nunca tive, mas de vez em quando a gente sofre uns arrepios no corpo que dá prá assustar. As notícias que veem da cidade não são boas. O Chiquinho me contou esta manhã enquanto o senhor dormia, que capitão Virgulino foi cercado pela federal na fazenda de coronel Zé Pereira. Ele não me deu maiores detalhes, mas me disse que foi um tiroteio intenso e que se salvaram apenas alguns cabras, que já estão presos. Não soube me dizer quantos foram, apenas que foi uma carnificina. Na opinião dele mataram Virgulino, Maria Bonita e uns quinze ou vinte cabras, e mais uns dez ou quinze do coronel Zé Pereira. O terreiro da fazenda mais parece um rio de sangue. Tem defunto espalhado prá todo canto. Me disse que arrancaram as cabeças de Lampião e Maria Bonita, botaram numa lata de querozene com cal e sal e levaram para Sergipe. Acho melhor o senhor ir até Laranjeiras se informar melhor dos acontecimentos. Chiquinho estava muito nervoso. Me disse que padre Fausto já estava a caminho do gabinete do prefeito junto com outros coronéis.
− E, como foi isso, Zé? Como tudo aconteceu?...Como ele soube desse tiroteio? Lampião passou por aqui ontem aqui.. como...
Inpaciente, sem saber que rumo tomar, Saturnino andava de um canto ao outro do alpendre, até que Zé o convenceu ir à cidade.
− Tá bom, Zé. Vamos pra Laranjeiras. Mas, tem que ser agora. Vá arrear os cavalos. Traga o rifle, meu revolver e a cartucheira cheia.
Celestina ficou apreenssiva. Não queria ver marido envolvido mais do que esteve na noite anterior, quando deu abrigo a Lampião, e se aventurasse numa viagem dessas sem ao menos ter noticias mais confiáveis. Poderia ser uma emboscada, como já acontecera tempos atrás, ou até ser preso por ter lhe dado abrigo... Temia pelo marido.
A cidade de Laranjeiras era um alvoroço só naquela manhã ensolarada e quente. Mais parecia dia de eleição, de tanta gente reunida ao entorno da prefeitura, cujo prédio também abrigava o Fórum, a Câmara de vereadores e a cadeia pública.
A multidão aguardava ansiosa o pronunciamento do prefeito que mandara um emissário até a fazenda de Zé Pereira para se informar dos acontecimentos. Todos estavam todos ávidos por notícias e saber quem havia denunciado Lampião... Como fora capturado...Onde fora encontrado...E, se realmente o haviam matado.
Coronel Saturnino apeou do cavalo em frente ao prédio do Paço municipal e se dirigiu imediatamente ao gabinete do prefeito, aonde já se encontravam vários líderes locais. Lá estavam alguns coronéis coiteiros, chefes de partidos políticos, padres, o emissasário de padre Cicero e outras autoridades menos importantes do Estado. Cumprimentou-os a todos e seguiu diretamente para o adro do paço observar a multidão que aguardava por informações.
No meio da multidão estava Sá Lorena, ao lado do marido..
No gabinete do prefeito, os líderes do alto comando udenista aguardava o retorno do menssageiro.
− Prefeito, o senhor já tem algumas notícias para nos adiantar? Perguntou coronel Saturnino, enquanto pendurava o chapéu de couro no cabideiro, logo abaixo do retrato do governador do Estado.
- Até agora sabemos pouca coisa, coronel. Apenas que Lampião e sua mulher foram mortos e seus corpos enviados para Sergipe. Segundo me disse esta manhã o empregado de Jeremias quando voltava para casa. O tiroteio durou uns vinte minutos.
- Já temos notícias que lá em Sergipe, estão tentando incriminar o coronel José Pereira Lima, e denunciá-lo por crime de acoitamento e por ter dificultado a ação da polícia. A coisa pode ficar feia para o nosso lado também, coronel.
- Tomemos cuidado, companheiros, disse temeroso.
Reunida na praça principal a multidão impaciente pedia por notícias. Aguns desaforados baderneiros iniciaram um tumulto, mas a polícia mesmo em número reduzido de homens pôde contê-los.
− Será que foi seu Quincas quem denunciou Lampião e recebeu o dinheiro da recompensa? Perguntava Sá Lorena aos curiosos ao seu redor, demonstrando alegria que estampava no rosto envelhecido pelas rugas.
− Não, foi Agaciel quando veio buscar doutor Brandão para examinar o pai, respondeu a secretária, também curiosa e arrempedida de ter dito que Virgulino estivera no consultório no dia anterior.
− Não foi Agaciel, disse alguém ao lado. Foi o próprio Ze Pereira.
Na verdade, ninguém sabia dos fatos.
Tentando ultrapassar o cordão de isolamento e chegar ao gabinete do prefeito, padre Fausto avistou-se com Sá Lorena, e insipidamente lhe disse:
− Está satisfeita agora, bruxa?
− Não lhe respondo com raiva. Não me interessa saber de sua preocupação. O senhor é que deve responder pelos seus atos. Seu passado...Sua fama...Apenas eu gostaria de saber quem foi o herói que dedurou este cafajeste!. O senhor que se cuide, padre! A coisa pode piorar para o seu lado. Os boatos se espalham...E eu...
A gritaria da multidão impediu que Sá Lorena completasse sua insatisfação.
− Foi coronel José Pereira, gente!. Gritou o açogueiro do outro lado da multidão! Eu trabalhei muitos anos prá ele. Ele nunca foi confiável. Sempre foi covarde e traiçoeiro.
− Olha, acredito no Zé açougueiro, disse Dona Cleusa, uma senhora católica e assídua frequentadora de reuniões políticas no gabinete do prefeito.
− Só pode ter sido mesmo Zé Pereira quem dedurou Lampião, disse Ernestino, um honem de baixa estatura e franzino que já havia trabalhado prá ele colhendo milho. É um homem sem caráter, desleal, e acima de tudo interesseiro, mão de vaca e avarento. Não paga pra quem trabalha pra ele. Vende a própria alma ao Diabo por dinheiro. É um miserável.
Todos concordaram com Ernestino e Zé açougueiro. Sabiam que o capitão Virgulino Ferreira estava escondido na fazenda de Zé Pereira, convalescendo-se da cirurgia do olho após ter passado pela fazenda de Saturnino.
Coronel Saturnino, homem forte na região, político influente, amigo e correligionário do governador do Estado, temia o que podería lhe acontecer. Entre tantos amigos, de quem tería ajuda, se necessário fosse provar sua inocência, contaria com o juiz de Direito de Angicos, o delegado da cidade de Laranjeiras, o Major Lucena, comandante da Policia Militar, padre Fausto, o bispo Don Francisco, padre Cícero, figuras respeitadíssimas, e tantos outros cidadãos influentes do Estado de Alagoas.
Coronel Saturnino permaneceu o dia toso em Anjicos. Pousou na fazenda do coronel Amâncio, outro coiteiro e amigo, com quem dividiu suas preocupações. Bebeu cachaça a noite inteira para aliviar-se da incômoda situação em que se encontrava.
Finalmente, na tarde do dia seguinte, após confirmadas as notícias da morte de Lampião e su a mulher, voltou para a fazenda. Armou seu bando, e pôs-se de prontidão a fim de se acautelar e prevenir-se de qualquer investida da polícia militar.
José Miranda Filho, ex-Presidente e fundador do PMDB em São Caetano do Sul, Venerável Mestre da Loja Maçônica G. Mazzini (grau 33), é advogado e contador, colabora com o jornal ABC Reporter e atua como Diretor Financeiro do Conselho Gestor do Hospital Benificente São Caetano. Posta no Blog do Miranda.
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