Definição

... da totalidade das coisas e dos seres, do total das coisas e dos seres, do que é objeto de todo o discurso, da totalidade das coisas concretas ou abstratas, sem faltar nenhuma, de todos os atributos e qualidades, de todas as pessoas, de todo mundo, do que é importante, do que é essencial, do que realmente conta...
Em associação com Casa Pyndahýba Editora
Ano VI Número 63 - Março 2014

Conto - José Geraldo de Barros Martins

Ilustração do autor

Isto É Igual Aquilo

Agostinho Junqueira acordou desperançoso naquele dia... ele não sabia o porque de tal estado de espírito, porém acordara daquela forma e pronto !!! Após um farto café da manhã, a base de suco de grapefruit, chá preto, uma pêra e de seu sanduíche predileto (pão, presunto crú e azeite alentejano), ele foi para aquele cantinho da casa em que costumava escrever seus escritos, este, no caso era encomenda de um jornal importante, para o suplemento cultural de domingo... nele, o nosso protagonista, confirmara aquela velha teoria de que existem coisas que são o que são, porém também podem ser outras coisas... citando exemplos existentes ao longo da história daa literatura (Baudelaire, Blake, Cortazar, etc.) Agostinho Junqueira sugere que o a luta de Muhamad Ali X George Foreman foi também a batalha de Kursk (*) e também foi a gripe que o assolou na semana passada... seu artigo terminava assim:

“Os grandes embates da história, estão estritamente relacionados com os maiores feitos no esporte, bem como os mínimos acontecimentos do cotidiano... ao contrário do que muitos pensam, existe um paralelismo magnético entre a história das nações com a história das copas do mundo... outro paralelismo ocorre entre acontecimentos cotidianos e os jogos de futebol ao longo da semana o que não deixa de ser uma demonstração cabal que a vida em seu conjunto é um fenômeno cíclico e inter-relacionado”.

Após mandar o texto para a publicação o nosso protagonista resolveu andar a pé pelo bairro e tomar alguma coisa em um bar qualquer... após caminhar algumas quadras ele pensou bem e descobriu o motivo de tal desesperança matinal: apesar dos jornais mostrarem-no como um intelectual bem sucedido, que sempre saia nas colunas sociais acompanhados das mais exuberantes beldades, ele estava sozinho... sabia que aquela imagem que a mídia fazia dele era apenas uma lenda, uma holografia vazia... aquela pessoa não era ele... aquele mundinho bem sucedido não era o dele... após pensar nestas coisas, ele escolheu um boteco aleatoriamente e sentou-se em uma mesa junto a entrada e pediu uma cerveja... enquanto aguardava a bebida reparou em uma mulher que compenetradamente lia um livro antigo na mesa ao lado... aquilo o deixou curioso... depois de algum tempo, (quando a cerveja já estava na metade) tomou coragem e perguntou a dama que livro era aquele.

- Ora, é o “Zohar – O Livro do Esplendor” - respondeu ela- você nunca ouviu falar?

- Vagamente... sei que é uma obra clássica do judaísmo, e também que fala sobre Cabala... dois temas que eu não domino... desculpe perguntar, mas você é judia ou ligada a estes grupos de Cabala-Pop, que agora estão na moda?

- Nem uma coisa nem outra, apenas gosto de boa literatura... só isso...

- E quem é o autor deste livro? E em que época foi escrito?

Na verdade este é um tema controverso pois a lenda diz que foi escrito no século II pelo rabino Shimon bar Yoachai, após este ficar 13 anos vivendo isolado em uma caverna, mas não há provas concretas nem da existência do rabino nem dos manuscritos em aramaico que deram origem ao livro... no Século XIII entretanto, um rabino espanhol chamado Moisés de León mostrou aos sábios trechos copiados do Zohar original, porém como ele nunca mostrou a ninguém o tal Zohar original, muitos suspeitam que este último seja o verdadeiro autor do “Zohar”, enquanto o primeiro era apenas uma lenda...

Agostinho Junqueira tomou o resto da bebida, convidou a mulher para acompanhá-lo na próxima cerveja e enquanto esperava o garçon trazê-la, teve um pressentimento: do mesmo modo que a luta de Muhamad Ali X George Foreman foi também a batalha de Kursk, o “Zohar” também poderia ser sua vida conjugal; ou seja tal qual esta obra clássica que pode ter sido escrito com base em uma lenda (no caso a existência do rabino Shimon bar Yoachai), ele poderia construir uma vida sentimental consistente (e quem sabe até um lar), usando como base a imagem dele que era fabricada pela imprensa... E quem seria a companheira que iria descobrir este novo homem? Ora, se o “Zohar” era uma alegoria da sua vida sentimental, esta pessoa só poderia ser uma leitora deste livro, no caso a pessoa que agora estava ao seu lado... simples, né?

Após algumas cervejas Agostinho Junqueira, sua nova companheira e o respectivo livro sairam em busca de um novo mundo, no qual parafraseando aquela clássica frase de para-choque de caminhão (**), o nosso protagonista poderá dizer: -”Com as mentiras que falam sobre mim, edificarei algo de verdade.”

(*) A famosa batalha envolvendo alemães e russos foi o maior embate com tanques de guerra da história.

(**) “Com as pedras que me atiram construirei o meu lar”

José Geraldo De Barros Martins é de São Paulo. Músico, pintor e escritor, desde 2001 publica seus desenhos e escritos no blog http://zegeraldo.free.fr.

No comments:

Autores

Ademir Demarchi Adília Lopes Adriana Pessolato Afobório Agustín Ubeda Alan Kenny Alberto Bresciani Alberto da Cunha Melo Aldo Votto Alejandra Pizarnik Alessandro Miranda Alexei Bueno Alexis Pomerantzeff Ali Ahmad Said Asbar Almandrade Álvaro de Campos Alyssa Monks Amadeu Ferreira Ana Cristina Cesar Ana Paula Guimarães Andrew Simpson Anthony Thwaite Antonio Brasileiro Antonio Cisneros Antonio Gamoneda António Nobre Antonio Romane Ari Cândido Ari Candido Fernandes Aristides Klafke Arnaldo Xavier Atsuro Riley Aurélio de Oliveira Banksy Bertolt Brecht Bo Mathorne Bob Dylan Bruno Tolentino Calabrone Camila Alencar Cândido Rolim Carey Clarke Carla Andrade Carlos Barbosa Carlos Bonfá Carlos Drummond de Andrade Carlos Eugênio Junqueira Ayres Carlos Pena Filho Carol Ann Duffy Carolyn Crawford Cassiano Ricardo Cecília Meireles Celso de Alencar Cesar Cruz Charles Bukowski Chico Buarque de Hollanda Chico Buarque de Hollanda and Paulo Pontes Claudia Roquette-Pinto Constantine Cavafy Conteúdos Cornelius Eady Cruz e Souza Cyro de Mattos Dantas Mota David Butler Décio Pignatari Denise Freitas Desmond O’Grady Dimitris Lyacos Dino Valls Dom e Ravel Donald Teskey Donizete Galvão Donna Acheson-Juillet Dorival Fontana Dylan Thomas Edgar Allan Poe Edson Bueno de Camargo Eduardo Miranda Eduardo Sarno Eduvier Fuentes Fernández Elaine Garvey Éle Semog Elizabeth Bishop Enio Squeff Ernest Descals Eugénio de Andrade Evgen Bavcar Fernando Pessoa Fernando Portela Ferreira Gullar Firmino Rocha Francisco Niebro George Callaghan George Garrett Gey Espinheira Gherashim Luca Gil Scott-Heron Gilberto Nable Glauco Vilas Boas Gonçalves Dias Grant Wood Gregório de Matos Guilherme de Almeida Hamilton Faria Henri Matisse Henrique Augusto Chaudon Henry Vaughan Hilda Hilst Hughie O'Donoghue Husam Rabahia Ian Iqbal Rashid Ingeborg Bachmann Issa Touma Italo Ramos Itamar Assumpção Iulian Boldea Ivan Donn Carswell Ivan Justen Santana Ivan Titor Ivana Arruda Leite Izacyl Guimarães Ferreira Jacek Yerka Jack Butler Yeats Jackson Pollock Jacob Pinheiro Goldberg Jacques Roumain James Joyce James Merril James Wright Jan Nepomuk Neruda Jason Yarmosky Jeanette Rozsas Jim McDonald Joan Maragall i Gorina João Cabral de Melo Neto João Guimarães Rosa João Werner Joaquim Cardozo Joe Fenton John Doherty John Steuart Curry John Updike John Yeats José Carlos de Souza José de Almada-Negreiros José Geraldo de Barros Martins José Inácio Vieira de Melo José Miranda Filho José Paulo Paes José Ricardo Nunes José Saramago Josep Daústin Junqueira Ayres Kerry Shawn Keys Konstanty Ildefons Galczynski Kurt Weill Lêdo Ivo Léon Laleau Leonardo André Elwing Goldberg Lluís Llach I Grande Lou Reed Luis Serguilha Luiz Otávio Oliani Luiz Roberto Guedes Luther Lebtag Magnhild Opdol Manoel de Barros Marçal Aquino Márcio-André Marco Rheis Marcos Rey Mari Khnkoyan Maria do Rosário Pedreira Mariângela de Almeida Marina Abramović Marina Alexiou Mario Benedetti Mário Chamie Mário de Andrade Mário de Sá-Carneiro Mário Faustino Mario Quintana Marly Agostini Franzin Marta Penter Masaoka Shiki Maser Matilde Damele Matthias Johannessen Michael Palmer Miguel Torga Mira Schendel Moacir Amâncio Mr. Mead Murilo Carvalho Murilo Mendes Nadir Afonso Nâzım Hikmet Nuala Ní Chonchuír Nuala Ní Dhomhnaill Odd Nerdrum Orides Fontela Orlando Gibbons Orlando Teruz Oscar Niemeyer Osip Mandelstam Oswald de Andrade Pablo Neruda Pablo Picasso Pádraig Mac Piarais Patativa do Assaré Paul Funge Paul Henry Paulo Afonso da Silva Pinto Paulo Cancela de Abreu Paulo Henriques Britto Paulo Leminski Pedro Du Bois Pedro Lemebel Pete Doherty Petya Stoykova Dubarova Pink Floyd Plínio de Aguiar Qi Baishi Rafael Mantovani Ragnar Lagerbald Raquel Naveira Raul Bopp Regina Alonso Régis Bonvicino Renato Borgomoni Renato de Almeida Martins Renato Rezende Ricardo Portugal Ricardo Primo Portugal Ronald Augusto Roniwalter Jatobá Rowena Dring Rui Carvalho Homem Rui Lage Ruy Belo Ruy Espinheira Filho Ruzbihan al-Shirazi Salvado Dalí Sandra Ciccone Ginez Santiago de Novais Saúl Dias Scott Scheidly Seamus Heaney Sebastià Alzamora Sebastian Guerrini Shahram Karimi Shorsha Sullivan Sigitas Parulskis Sílvio Ferreira Leite Silvio Fiorani Sílvio Fiorani Smokey Robinson Sohrab Sepehri Sophia de Mello Breyner Andresen Souzalopes Susana Thénon Susie Hervatin Suzana Cano The Yes Men Thom Gunn Tim Burton Tomasz Bagiński Torquato Neto Túlia Lopes Vagner Barbosa Val Byrne Valdomiro Santana Vera Lúcia de Oliveira Vicente Werner y Sanchez Victor Giudice Vieira da Silva Vinícius de Moraes W. B. Yeats W.H. Auden Walt Disney Walter Frederick Osborne William Kentridge Willian Blake Wladimir Augusto Yves Bonnefoy Zdzisław Beksiński Zé Rodrix