Definição

... da totalidade das coisas e dos seres, do total das coisas e dos seres, do que é objeto de todo o discurso, da totalidade das coisas concretas ou abstratas, sem faltar nenhuma, de todos os atributos e qualidades, de todas as pessoas, de todo mundo, do que é importante, do que é essencial, do que realmente conta...
Em associação com Casa Pyndahýba Editora
Ano VI Número 63 - Março 2014

Releitura - Ferreira Gullar


3 Gullares

Ferreira Gullar (José Ribamar Ferreira), nasceu no dia 10 de setembro de 1930, na cidade de São Luiz, capital do Maranhão, quarto filho dos onze que teriam seus pais, Newton Ferreira e Alzira Ribeiro Goulart. Estreou em poesia em 1949 com o livro Um Pouco Acima do Chão. Em 1951 transferiu-se para o Rio de Janeiro, onde começou a trabalhar como jornalista. As experimentações gráficas contidas em seu livro A Luta Corporal (1954) motivaram sua aproximação com os poetas paulistas Décio Pignatari e os irmãos Augusto e Haroldo de Campos, que lançariam mais tarde o movimento da poesia concreta (1956). Inicialmente, Gullar participou do movimento, mas afastou-se em 1959 para criar o grupo neoconcretista. No início dos anos 60, o poeta dedica sua poesia mais a temas sociais e ao engajamento político. Em 1964 filia-se ao Partido Comunista Brasileiro. Em 1971, com o recrudescimento da ditadura militar, partiu para o exílio (Rússia, Chile e Argentina), de onde retornou em 1977. Na Argentina, Ferreira Gullar escreveu o Poema Sujo, livro lançado em 1976, com o poeta ainda no exílio. Uma das vozes mais expressivas da poesia brasileira, a linguagem de Gullar vai além do horizonte das palavras, pois o poeta é também crítico de arte e pinta quadros, faz desenhos e colagens.
Traduzir-se

Uma parte de mim
é todo mundo:
outra parte é ninguém:
fundo sem fundo.

Uma parte de mim
é multidão:
outra parte estranheza
e solidão.

Uma parte de mim
pesa, pondera:
outra parte
delira.

Uma parte de mim
almoça e janta:
outra parte
se espanta.

Uma parte de mim
é permanente:
outra parte
se sabe de repente.

Uma parte de mim
é só vertigem:
outra parte,
linguagem.

Traduzir uma parte
na outra parte
— que é uma questão
de vida ou morte —
será arte?

Um instante

                    Aqui me tenho
                    Como não me conheço
                              nem me quis

                    sem começo
                    nem fim

                              aqui me tenho
                              sem mim

                    nada lembro
                    nem sei

                    à luz presente
                    sou apenas um
                    bicho
                              transparente

Cantiga para não morrer


Quando você for se embora,
moça branca como a neve,
me leve.

Se acaso você não possa
me carregar pela mão,
menina branca de neve,
me leve no coração.

Se no coração não possa
por acaso me levar,
moça de sonho e de neve,
me leve no seu lembrar.

E se aí também não possa
por tanta coisa que leve
já viva em seu pensamento,
menina branca de neve,
me leve no esquecimento.

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