Definição

... da totalidade das coisas e dos seres, do total das coisas e dos seres, do que é objeto de todo o discurso, da totalidade das coisas concretas ou abstratas, sem faltar nenhuma, de todos os atributos e qualidades, de todas as pessoas, de todo mundo, do que é importante, do que é essencial, do que realmente conta...
Em associação com Casa Pyndahýba Editora
Ano VI Número 63 - Março 2014

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Editorial




Green Desert

Nada vos sovino:
com a minha incerteza
vos ilumino

Ferreira Gullar in Poemas Portugueses (4)

Setembro TUDA! Tudo se transforma mas nada muda! Os ares da renovação sopram no Oriente, mas a poeira que levantam ainda fere os olhos das gentes... Levantem suas armas! Defendam-se! A grande revolução começa agora, e não vai ser televisionada... Abaixo o fim da diversidade no mundo! Seja em grandes cidades como Beirute, Damasco ou Istambul, seja no árduo deserto dos Beduínos, em campos de refugiados palestinos, no Líbano ou nas Pirâmides do Egito, a diversidade de culturas, religiões e pensamentos precisa ser preservada. Não me venham com imposições... nem mesmo o que e bom deve ser imposto, que de imposto já chega o que pagamos enquanto os poderosos sonegam - mas não é quem pensa quem tem o poder? Um dia... enquanto isso, eles gastam dinheiro com o tráfico de suas influências! Apolítica na coletividade mas enxerida na individualidade, TUDA fala tudo, e fala o que quer... todos falam o que querem, e isso se dá só porque TUDA já nasceu democrática - não teve a democracia empurrada goela abaixo! Se assim fosse talvez não funcionasse.

Democrática e diversa, TUDA não faz apologias nem propagandas. TUDA não julga ou discrimina, TUDA apenas TUDA... TUDA na totalidade das coisas e dos seres, TUDA do total das coisas e dos seres, TUDA do que é objeto de todo o discurso, TUDA da totalidade das coisas concretas ou abstratas, sem faltar nenhuma, TUDA de todos os atributos e qualidades, TUDA de todas as pessoas, TUDA de todo mundo, TUDA do que é importante, TUDA do que é essencial... enfim, TUDA do que realmente conta!

É isso companheiros... na DUTA, só por hoje, devagar & sempre, e TUDA de Bom!

Eduardo Miranda
O (auto-proclamado) Editor

P.S.: por um problema "legal" com a Google/GoDaddy, mudei meu "portal" de eduardomiranda.info para edotm.info. Pode ser com http://, com www, com http://www, ou mesmo sem nada... você chega lá!!!

Dívida Interna


Editor
Eduardo Miranda

Capa
José Geraldo de Barros Martins

Digitação
Eduardo Miranda & Teresa Thinen

Revisão
Dos autores...

Colaboradores
Ali Ahmad Said Asbar, Arnaldo Xavier, Celso de Alencar, Cesar Cruz, Dorival Fontana, Eduardo Miranda, Hamilton Faria, Husam Rabahia, Issa Touma, José Geraldo de Barros Martins, José Miranda Filho, Pedro Du Bois, Plínio de Aguiar, Ronald Augusto, Roniwalter Jatobá, Ruy Espinheira Filho, Santiago de Novais, Vagner Barbosa.

E-mail
tuda.papel.eletronico@gmail.com

Poesia - Arnaldo Xavier




Shirley Monestier, 3 Stages of Life -
acrylic and trowled plaster on canvas

(...)

Sopro de semente sido Corvo habita corpo rio
náufrago sendo crustáceo sábio compreende
alicerce de asa sido cicatriz lição de porta

circunflexo olhar sendo gelado lábio osso
silencioso pedaço sido alvorada dente aceso
Pano espanto vermelho sendo poeira estrelada

ave varrendo torres e arbustos sido fruto promessa
de cura paisagem sendo tarde desvenda milagre
flor lua virtual alma sido lagoa pintando sombras

em branca parede sendo agulha curva estrada
frieza rapina sido pesada porta Abismo sem
fim definido sendo morte avessa luz bailarina

Perfume prepara templo sido amargo errante
despido vento degrau sendo homem resume
medida recorta luz sido um simples número

indecifrável pedaço sendo submerso pássaro
escada Sublime devorador sido crime de amor
hospitalar desvio sendo montanha filosofa

(...)

[ in ÔlhÔs de Xadrez, inédito ]

Poesia - Plínio de Aguiar




Sunset River Crossing, 28 x 42 inches Oil on Canvas by Laurie Pace
Evil Way

De onde saíram foi do beco em frente
E havia neblina na hora da corrida
De patas, mais pareciam pneus em grito.

Certo, tudo não sei como saiu de tropel
Com chuva metralhando o asfalto
Motores em guitarras rastreando enxofre.

Poeira (havia poeira com tanta chuva?) no ar,
Nos meus pulmões equivocados.

SSA, agosto 2010

Poesia - Ruy Espinheira Filho




Maasai Herdsman, by Gary Palmer

Depois

1.

Fotografias.
Estou à frente do Vesúvio,
bem no alto,
mas chegamos no final da tarde
e não nos deixaram subir até a cratera.

E aqui ele em outras imagens:
visto de uma rua de Nápoles,
e do meio da baía, quando navegamos para Capri,
e a guia observa que se trata do vulcão mais perigoso da Europa
e uma turista argentina fica tensa
comentando que não se deveria dizer aquilo quando estamos tão perto,
balançando indefesos nas águas.
Como se não estivéssemos sempre indefesos,
como se o mundo não houvesse sido destruído várias vezes
por seus próprios estertores,
sem necessitar de ajuda de meteoros ou cometas
postos em nosso caminho pela Estrela da Morte,
porque moramos num planeta vivo
e por isso mesmo nele a vida
acontece
e morre.

Bela baía de Nápoles.
Para o bem da turista,
a guia não disse que sob aquelas águas azuis,
às vezes de um verde límpido,
há também grandes forças ígneas concentradas
buscando passagem.
Mas nada aconteceu enquanto navegávamos,
a não ser uma certa inquietação das águas
ao vento e à chuva.

2.
Ali estava o Vesúvio
com nuvens cândidas bem no alto,
sobre sua boca emudecida
há quase dois mil anos
e que alguns estudiosos dizem que pode voltar a falar
a qualquer momento
porque seu ciclo é de cerca de dois mil anos,
do que, aliás, duvidam as pessoas que continuam
junto a Pompéia e Herculano,
como no tempo de Plínio o Velho,
Plínio o Moço
e do Poeta Trágico com seu cão de guarda.

E o monte continua em silêncio
e as nuvens ali estão como a embalá-lo
suavemente
para que repouse ao menos por mais
vinte séculos.

3.
Anacapri também encoberta,
mas ascendemos às nuvens e vemos o que escondem,
o que é como uma
epifania.

Algumas esperanças,
como ocorre acontecer a algumas esperanças,
falham: como a minha de encontrar
o gnomo que apareceu no quarto de Axel Munthe
e com ele conversou longamente.
Sim, eu sabia
que fora noutro quarto e noutro tempo,
mas isso, na verdade, não importava,
porque tais circunstâncias só são importante em nosso cotidiano menor,
opaco,
um gnomo é um ser superior,
embora haja quem não acredite neles, como nos deuses,
como em Tróia e Shakespeare,
mas eu continuo lendo as histórias dos deuses,
o inexistente Shakespeare
e visitando a lendária Tróia,
desde que a ela fui levado inicialmente por Homero,
depois por Schliemann
e vezes incontáveis pelos próprios sonhos,
que me fazem conviver com os guerreiros na praia
e nas muralhas.

Não, não vi com o gnomo,
mas sei que ele estava no quarto do doutor,
como outros de sua espécie estão em outras partes,
e, se creio neles,
eles existem.
E não morrem nunca,
como os deuses,
como Tróia
e Shakespeare.

4.
Caminhar, caminhar.
Subir e descer por velhos degraus muito espaçados
e grandes pedras
que certamente foram movidas por vontade divina
de sua longínqua origem àquelas alturas.

Ver no alto
a Acrópolis
e dela
a Ágora de cinco mil anos de História
e cintilações de arte
e pensamento.

Em Delfos
sonhar visitantes milenares vindo buscar a ajuda
de Atena e Apolo
e outros,
caminhando entre ninfas, musas, centauros,
querendo ver desde o futuro amoroso
ao destino das guerras.

5.
Continuar.
Navegar pelo Meditarrâneo até Veneza,
Onde carregamos e puxamos malas
subindo e descendo escadas e pontes
e nos perdendo em ruas labirínticas
e bebendo vinho e cerveja
e ouvindo música brasileira na Praça São Marcos
antes que tudo afunde de uma vez nas águas.

(A humanidade de depois não acreditará
na cidade das gôndolas,
como não acreditamos nos deuses,
em Tróia,
nos gnomos,
em Shakespeare
e na Atlântida.)

6.
Trens em greve.
Dormir em Milão.
Voar na manhã seguinte sobre
os Alpes Suíços.

7.
Paris.
A Torre Eiffel pondo à prova
os corações terrestres. E aqui estamos,
bem acima dos corvos,
olhando a grande cidade,
séculos de cultura e lutas,
nossa mãe de tantas maneiras.

Faz um frio de doer, mas pedimos
vinho quente.
Sobreviveremos.

8.
Rive Gauche.
Não vejo Sartre e Simone,
nem Fitzgerald, nem Hemingway.
No Les deux Magots não há lugares,
mas bebemos e comemos
no Café de Flore,
comentando o atraso costumeiro, há já muitos anos,
de Henry Miller e Camus.

E em minha saudade passa, murmurando
il faut être toujours ivre,
Baudelaire.

9.
Trago comigo os lugares onde estive.
Não sou como os antigos que falavam
em sacudir das sandálias o pó dos caminhos.
Não, guardo tudo,
sempre guardo tudo,
e especialmente guardarei das últimas caminhadas
o seu espesso pó de iluminar a alma.

10.
Das viagens não regresso
jamais.

Salvador, dezembro de 2010.

Poesia - Celso de Alencar




"En El Reino de DiosTodo es Posible", by Cuban artist Rodriguez

Tomemos chá, minha irmã

Tomemos chá, minha irmã,
hoje, pela manhã,
porque à tarde
nosso pai virá do céu.
Suas botas encontram-se engraxadas
e suas roupas
dispostas sobre a cama.
A frente da casa foi varrida
e nenhum outro pedregulho mais se vê.
Os cravos despontam no jardim
com esplendorosas cores
rosas e brancas
e breves filetes de açúcar e vinho.
Os móveis brilham
como brilha o sol sobre o mar
e suas gavetas murmuram
cantigas trêmulas
nos seus movimentos breves
de abrir e fechar.
Aguardemos a tarde, minha irmã.
Colhamos jasmim para os vasos da sala
e para nossos pescoços e braços.
O dia tece sua própria luz.
Não demora, logo chega a tarde.

[in Poemas Perversos]

Poesia - Santiago de Novais




Ilustração enviada pelo autor


Ponto Final

Sou o lago, você a pedra.
Vejo a lua e o sol e tudo mais acima e abaixo.
Que vês?
Tú não me feres. Me agita apenas.
Eu volto ao normal, você se desgasta.
Eu te sufoco. Você me deixa mais mole.
Não desapareço, viro outras coisas, neves.
Você sempre pedra nem reflete.
Provoco flores.
Você destrói as sementes.
Distraio pessoas.
Você as sepulta.
Tú me conténs.
Eu nada de ti.

Poesia - Dorival Fontana




Sinner, by Nuax

Inventário
A única certeza na vida
Além da morte física,
É prosseguir.
Fora algumas exceções
Para frente é que se deve ir.
Mesmo sem saber pra onde
Continuo...
Ante desencontros e enganos
Procuro algum sentido
(mesmo pouco, não tão nobre ou falido).
Parece que tudo resume-se
Numa equivocada existência
(aparente aparências).
Pela manhã o medo antecipa-se.
Pesadelos noturnos materializam-se.
O café sem açúcar, o pó mágico,
O whiski de ontem... tudo é antídoto.
Clarividências que se perdem
facilmente na consciência.
O primeiro bom-dia sangra
a dor do contato inevitável.
O dia desaba etéreo,
minha fé desintegra-se
entre a virtude e a maldade.
A felicidade ingenua é
perigosa criação para os suicidas.
Talvez seja a morte passagem
ou alívio passageiro para tantas dores.
Do arrependimento à absolvição,
Dos nomeados pecados praticados,
Nenhum milagre leva à redenção,
Nenhum perdão me cabe.

Poesia - Pedro Du Bois




Rembrandt - The Philosopher in Meditation, 1632
Responder

A resposta
ao impulso
gera
nova pergunta
e a ação descabida
do movimento: olho o nada
                    onde me vejo
                    estático

          habito o mínimo
          necessário à vida:

                         a morte me desconhece.

Poesia - Vagner Barbosa




Anton Semenov

Geometria óssea

Construo um edifício
Projeto ousado
Fundado
No nada
Aprumo estruturas
Verticais que conduzem
Ao vácuo
Ergo alvenarias
Com meu próprio húmus
As uno
Garagens, apartamentos
Penduro varandas
Instalo elevadores
Solares
Subo à cobertura
Aprecio
O precipício
Construo um edifício
Nele habito

Crônica - Roniwalter Jatobá




Home Sweet Home Cottage, East Hampton, by Frederick Childe Hassam

Casa paterna

Tenho em casa uma fotografia amarelada pelo tempo. É o mais antigo registro da secular família do meu avô paterno. No verso, numa caligrafia bonita, ele anotou uma dedicatória ao parente distante. No final, registra o ano da pose fotográfica: 1937.

Ali está a família reunida na véspera de uma festa. Reconheço em sérios semblantes algumas tias já adultas e dois tios, ainda crianças. Um quadro incompleto. A maioria estava longe, muitos haviam sumido em busca de seus destinos pelo mundo.

Sinto a falta, entre as mulheres, de tia Nanã, que há pouco realizara seu casamento. O pai, o mais velho dos homens, já vivia pelas minas do Mimoso, à procura de cristal de rocha e pedras preciosas. O tio Preto, assim apelidado devido a coloração mais escura de sua pele, também seguira as mesmas trilhas do garimpo, mas contam que infernizava a todos pelo vício nos jogos de azar. Na mesma época, o tio Olegário já havia partido para o Rio de Janeiro, fascinado pelo futuro na então Capital Federal, e para onde seguiria, depois, também o tio Deco. A velha foto mostra que, pouco a pouco, a família ia se fragmentando, com cada filho criando asas após a fase adulta.

Um relatório do Eurostat, o instituto de estatísticas da União Européia, revelou há algum tempo o que vem mudando em relação à família. Os jovens europeus relutam em deixar o colo da mamma. Segundo o escritor italiano, Piero Citati, eles pertencem a uma geração de eternos adolescentes, que não têm pressa nem interesse em crescer e, ao contrário de seus avós, não querem se tornar adultos tão cedo. Na verdade, retardam o mais que podem o abandono da casa paterna e o casamento.

Os italianos são campeões no chamado mammismo. Em 1987, 60% dos rapazes e moças continuavam a viver – na maioria dos casos, economicamente independentes – na casa dos pais. Oito anos depois, em 1995, aquela porcentagem havia crescido bastante: 71% dos jovens italianos passaram a considerar desnecessário e pouco interessante viver por conta própria, ou seja, longe da saia da mãe.

Também no Brasil, a casa dos pais também virou refúgio seguro. Antes, sair de casa aos vinte anos era obrigação. Hoje, seja pela acomodação da juventude ou pelo funil cada vez mais estreito no mercado de trabalho, mudou a situação.

A primeira vez que deixei a casa paterna tinha quinze anos. Por um longo ano, morei no Rio de Janeiro. Desempregado a maior parte do tempo, foi difícil a distância do lar. No retorno, minha mãe chorou ao ver filho magro com cara de faminto. Realmente abatido, por dois meses caminhei solitário pelas margens do rio Aipim, tentando resgatar a tranqüilidade perdida.

A partir daí, chegou o medo. Embora sentisse necessidade de romper os laços com a casa paterna, vinha o receio de encontrar os mesmos obstáculos da primeira viagem. Sofria. Quando imaginava a visão da cidade grande, sentia calafrios e vinha o temor de desistir nos primeiros dias.

Em 1970, depois de dar baixa do Exército em Salvador, finalmente decidi viajar para São Paulo. No ônibus, nos caminhos de Minas e Bahia, sentia temores e tremores. Muitos anos depois, sou capaz de concordar com os jovens. Já superei a casa dos sessenta anos, mas ainda mantenho a intuição de um adolescente de quinze que adora raspar os fragmentos do doce de leite preparado pela mãe numa panela de cobre, no calor fumegante do fogão a lenha.

Conto - José Geraldo de Barros Martins




Ilustração de José Geraldo de Barros Martins
Aconteceu Num 7 De Setembro

Jeromyas Jerênimo Júnior e Eric Mouzinho Von Péricles Filho adoraram o desfile de 7 de setembo... quando seus respectivos pais Jeromias Jerênimo e Eric Von Péricles tiveram a idéia de levá-los eles acharam que seria chatísimo, agora bricavam no quintal enquanto os velhos tomavam cervejas e comiam petiscos na varanda, enquanto suas respectivas mães Guaranyra Nara Néia e Auroreta Mouzinho Fitzmaurice, após fazer compras, estavam preparando o almoço na cozinha enquanto bebericavam um vinho do porto ...

- E o que foi que elas compraram???

Camarão, sardinha, tomate, cenoura e alface...

- E compraram isto para fazer o quê???

O crustáceo, o peixe e a hortaliça para um cuscuz paulista enquanto que o legume e a verdura eram para a salada...

- E quanto a eles, sobre o quê conversavam???

Sobre a teoria de Jeromias Jerênimo.

- E que teoria era esta???

Ele afirmava que, ao contrário do que muitos pensam, as batalhas decisivas para a história mundial nos séculos XIX e XX, foram inspiradas em batalhas travadas pelo exército brasileiro... segundo ele: “A Batalha de Gettysburg (1) era uma cópia da Batalha de Tuiuti (2)”, assim como a estratégia utilizada pelos japoneses contra os russos na Batalha de Mukden (3) foi baseada na Batalha do Jenipapo ocorrida no Piauí em 1823, enquanto que a Batalha de El Alamein(5) seria uma repetição da Batalha de Canudos... ele até pensara até em publicar um livro sobre o assunto; “De Tuiuti ao Dia D” seria o título...

- E Eric Von Péricles acreditava nesta estranha teoria???

É claro que não... ele achava que era uma tremenda besteira, argumentava que para início de conversa a Batalha de Gettysburg ocorreu e 1863 enquanto que A Batalha de Tuiuti ocorreu 1866, ou seja três anos depois... logo seria impossivel uma coisa que aconteceu antes copiar ou ser influenciada por uma outra coisa que aconteceu depois... “seria como acusar Cervantes de ser influenciado por Machado de Assis”... em segundo lugar a diferença numérica entre as comparações era abissal: na Batalha de Gettysburg lutaram cerca de 150 mil soldados com cerca de 50 mil baixas enquanto que Tuiuti teve cerca de um terço destas quantidades... mais gritante ainda era diferença entre Batalha de Mukden e a Batalha do Jenipapo, enquanto a primeira teve cerca de meio milhão de combatentes da segunda participaram umas quatro mil pessoas... quanto a comparar El Alamein com Canudos, apesar do caráter agreste de ambas, eram coisas muito distintas... uma coisa era o Marechal Erwin Rommel “a raposa do deserto”... outra coisa era Antônio Conselheiro... Para zombar de seus velho amigo, Eric Von Péricles exclamou brincando e brindando com o copo de cerveja: “Pindorama “Über Alles (6)!!!”

- E enquanto isto o que elas faziam na cozinha???

Antes de ir ao supermercado elas haviam misturado a farinha de milho com a farinha de mandioca com a água morna e juntado a cebolinha a salsa e o coentro, deixando tudo descansar... agora já haviam refogado a cebola, os tomates e a pimenta, e acrescentado os camarões .... após retirar tudo do fogo juntaram com a farinha umedecida. Enquanto preparavam o cuscuzeiro alternando esta mistura com palmito, ovos cozidos, camarões grandes e sardinhas, Guaranyra Nara Néia se orgulhava que seu filho apesar de Júnior, havia herdado o “Y” de seu nome (Guaranyra) e invés de Jeromias com “I”como pai, se chamava Jeromyas com “Y”... já Auroreta Mouzinho Fitzmaurice se orgulhava de ter conseguido colocar o sobrenome de sua mãe portugues (Mouzinho) em seu filho... “pensei em colocar o sobrenome irlandês do meu pai ( Fitzmaurice) mas além de grande iria ficar estrangeiro demais”...

- E no final, como ficou o cuscuz???

Ficou uma delícia...

- E como terminou a conversa de nossos protagonistas pseudo-historiadores???

Jeromias Jerênimo contra-argumentou, citando Borges enquanto abria outra cerveja...

- E o que ele contra-argumentou???

Que o tempo cronológico era uma ilusão, que as diferenças quantitativas entre as batalhas eram meros detalhes de um tipo de pensamento mecanicista e que se “El Alamein” fosse mais importante do que “Canudos”, haveria uma grande obra como “Os Sertões” escrita em sua homenagem... e mais importante ainda do que as glórias de todas aquelas batalhas, mais significativo do que todos os argumentos, era a alegria de estar à mesa com familiares e amigos saboreando aquela salada e aquele cuscuz paulista....


(1) Ocorreu em 1863 na Guerra Civil Norte-Americana.
(2) Ocorreu em 1866 na Guerra do Paraguai.
(3) Ocorreu em 1905 na Guerra Russo-Japonesa.
(4) Ocorreu no Piauí em 1823 durante a Independência Brasileira.
(5) Ocorreu em 1942 na Segunda Guerra Mundial.
(6) Pindorama acima de tudo.

Conto - José Miranda Filho




Filhos do Sertão, de Edmilson Costa

O Retrato do Sertão - 19

Padre Fausto teve conhecimento da prisão de Juvenal através de amigos que o mantinham informado de todas as atividades do Delegado. Apressadamente se dirigiu à delegacia de polícia para saber as razões de sua prisão. Furioso e descontrolado, foi até a sala do Delegado pedir-lhe explicações.

- Desculpe-me Delegado, mas quero saber o motivo da prisão desse infeliz! Ele já teve a plantação queimada, perdeu tudo o que tinha... a morte da mulher, e ainda tem de ser preso? Não acha que o coitado já sofreu demais? Qual a razão que o senhor tem para decretar sua prisão? Poderia justificar-se?

Recostado na velha espreguiçadeira de piaçava, já desgastada pelo tempo, ao lado da estante de jacarandá repleta de livros jurídicos e velhos exemplares de juristas consagrados, estante esta que servia de divisão entre sua sala e a sala do escrivão, cachimbo pendurado na boca, que gostava de pitar nas tardes livres, o Delegado coçou a barbicha embranquecida pelo tempo e tantos anos de profissão, passou a mão nos poucos cabelos grisalhos que ainda lhes restavam, pensou... pensou... e num tom rancoroso, de quem já estava de saco cheio de ouvir falar da morte de Sá Lorena, gritou:

- Padre, me desculpe, não aguento mais insinuações de quem quer que seja! É o senhor, o Promotor, o Juiz... Juvenal foi detido por ter se evadido logo após o sepultamento de sua mulher e não ter acatado o mandado judicial expedido pelo Juiz de Direito de Laranjeiras. Não fui eu quem o mandou prender! Há mais pessoas interessadas em sua prisão, e não somente eu. Apenas cumpri a ordem do Juiz. Como ele está recolhido à cadeia, vou aproveitar a oportunidade para interrogá-lo mais uma vez, minuciosamente, sobre a morte de sua mulher. Espero que ele me esclareça algumas dúvidas que tenho sobre o assassinato dela. É meu dever esclarecer todos os detalhes deste crime. Desde a noite em que ela foi assassinada... Por que ele fugiu após o enterro... Por que ele não procurou o médico... Por que recusou o auxílio de duas testemunhas, cujos nomes estamos investigando... Já me precavi de tudo. Tomarei calmamente seu depoimento. Não quero complicações para o meu lado. Tudo o que ele disser será na presença do doutor Promotor. Suas declarações serão anexadas ao inquérito. Se o senhor quiser falar com ele, faça-o agora. A liberdade dele, entretanto, está dependendo de Alvará de Soltura, que segundo me disse seu advogado esta manhã, está na mesa do Juiz. Enquanto ele estiver detido, aproveitarei para esclarecer algumas dúvidas, que com certeza ele saberá me dizer. Segundo minha experiência policial padre, ele sabe quem é o autor dos disparos que culminaram na morte de sua mulher. Ele acoberta esse assassino. Tenho absoluta certeza disso! A razão de não querer delatá-lo está relacionada a algum acordo com gente influente da sociedade. Por enquanto, é segredo. Mas tenha certeza, vou descobrir. Só me falta saber as razões desse acobertamento. Desconfio de quem é o autor do crime! Mas isso é confidencial e o interrogado irá confirmar. O senhor saberá, não tenha dúvida disso!

Padre Fausto impaciente e nervoso, pediu ao Delegado permissão para encontrar-se com ele na cela, a sós.

- Filho da puta... o que aconteceu? Deu com a língua nos dentes? Por que lhe prenderam, idiota? Por que fugiu? Precisava se esconder? Esbravejava padre Fausto, fora de si.

-Não sei, padre... foi um momento infeliz. Fiquei sabendo que a polícia estava à minha procura e fugi com medo de ser preso. Mas não contei nada pro Delegado sobre o assassino de Sá Lorena. O senhor pode ficar tranquilo. Jamais teria coragem de denunciar alguém. Direi que não vi o rosto do autor dos disparos. Não tenho como identificá-lo. Afinal, trato é trato.

- Você quer jurar tudo isso perante Deus, através de confissão, e dizer que não sabe quem matou sua mulher?

- Juro! Confesso-me agora e afirmo na fé de Deus e em sua presença que jamais direi qualquer coisa.

Padre Fausto, após tomar a confissão de Juvenal, retirou-se do xadrez, convicto de que Juvenal apontaria Tonho como o autor do crime. A confissão é um ato de fé e sagrado! Rejubilava-se!

Na manhã do domingo seguinte, dia ensolarado e quente, durante a missa das sete horas, padre Fausto proferiu um sermão no qual exortava a população desacreditar de comentários maldosos que se espalhavam pela cidade desferida por dois vagabundos cachacistas, sem mérito, honra e sem moral para serem levados a sério.

- Ninguém tem a virtude de saber a verdade antecipadamente e prever acontecimentos futuros. Esse dom é somente de Deus. Só ele tem poderes para falar, julgar e condenar as pessoas. Lembrem-se do assassinato de Abel. Quem em sã consciência poderia imaginar um delito desses? – Advertia padre Fausto aos fiéis presentes, confiante de que suas preleções pudessem fazer com que os fiéis desacreditassem dos boatos e intrigas que se difundiam pela aí sobre ele. - Quem tem telhado de vidro, não atira pedra no telhado do vizinho, porque o retorno lhe será fatal – pregava, eufórico, e ao mesmo tempo temeroso!

Os fiéis se entreolhavam, desconfiados sem entender coisa alguma. Naquele domingo, todos saíram da Igreja atordoados pelo sermão do Padre. Jamais haviam ouvido palavras tão contundentes e ásperas, como se ele desejasse atingir alguém ou desculpar-se por algo que fizera. Todos tiveram essa impressão.

- Como ele pode querer desculpar-se de uma coisa que ainda não aconteceu? - dizia Maninha às carolas à porta da igreja. - Eu o conheço bem! Na experiência que tenho e na convivência com ele durante esses anos todos, acho que ele quer se livrar de alguma coisa que cometeu. Ele que se cuide, pois sua fama de mulherengo e cachacista já se espalhou á muito tempo pela cidade. Não é de agora!

- A ordem que o Promotor havia dado ao Delegado era para apressar as investigações até descobrir o verdadeiro assassino de Sá Lorena. O Delegado já havia tomado o depoimento de todas as pessoas que se envolveram com Sá Lorena. Até o momento, porém, tinha a certeza de que Juvenal sabia quem era o assassino, contudo não tinha provas suficientes para indiciar alguém, com exceção do próprio Juvenal, por ter fugido. Os depoimentos de seu Quincas foram suficientes para inocentá-lo e excluí-lo do rol dos suspeitos. Algumas dúvidas foram esclarecidas e confirmados por outras testemunhas. Não obstante o Delegado desconsiderar a versão que seu Quincas dera sobre o encontro dele com o fantasma de Sá Lorena, e como não se convencera do testemunho de Tonho, achou prudente observar melhor o comportamento dele. Em trinta e tantos anos de polícia jamais ouvira tamanha besteira.

- Isso é ridículo, dizia, manuseando as folhas do inquérito. Mas investigação é coisa séria. Tem-se que levar tudo em consideração. Se não foi Juvenal quem mais poderia ter motivos para matar essa mulher, meu Deus? - pensava o Delegado envolto em dezenas de mistérios. - E, se foi mesmo Tonho? Motivos ele tinha de sobra, como ele mesmo declarou. Será que não foram os dois roceiros apontados por seu Quincas que lhe avisaram da morte de Sá Lorena? Que motivos eles teriam? Assalto? Quem eram eles?

Como costumava fazer nos finais de semana na venda de Maninha, Esperidião, soldado da polícia local, encostado num canto do balcão, tomava seu aperitivo solitário, quando do outro lado ouviu um sitiante que soube depois chamar-se Firmino, falar para seus companheiros que sabia quem tinha matado Sá Lorena. Era uma noite quente e estrelada, e Esperidião, policial experiente, se aproximou sem se identificar e ofereceu-lhes uma bebida. Entrosou-se no grupo e começaram a beber. Firmino era o mais sóbrio. Depois de um gole e outro, Firmino afirmou para Esperidião que Farinheira e Catingueiro, seus conhecidos tinham visto o assassino de Sá Lorena.

- Eles estavam voltando para casa, quando na bifurcação da estrada de Poços dos Anjos, viram padre Fausto descer da carroça empunhando um fuzil e se acoitar atrás do pé de juazeiro. Disse que o padre zangado queria saber o que eles estavam fazendo àquela hora, naquele lugar - disse Firmino.

Esperidião anotou o endereço de Farinheira e Catingueiro, e levou ao conhecimento do Delegado.

- Seriam eles os dois mateiros a quem seu Quincas se referiu Esperidião? - disse o Delegado, sorridente. Peça ao Getúlio para expedir uma intimação urgente. Você mesmo se encarrega de cumpri-la.

Eles estavam dormindo, curando-se da ressaca da noite anterior quando Esperidião lhes deu a ordem de prisão. Não ofereceram qualquer resistência, apenas pediram para comunicar ao padre Fausto.

Diante do Delegado confirmaram tudo o que o soldado Esperidião ouvira de Firmino. O Delegado tomou o depoimento e mandou comunicar ao padre Fausto sobre a prisão. As dúvidas que tinha para esclarecimento do crime começavam a clarear.

Crônica - Cesar Cruz




Cappuccino with Friends, by Michael Flohr

O Sol do inverno

Como é gostoso o Sol do inverno! Tão diferente do Sol do verão, que nem parece o mesmo.

No verão ele vem agressivo, inclemente, causticante. Para nós, que circulamos por uma metrópole de cimento, como São Paulo, em nossos trajes de trabalho, o Sol é um inimigo desabrido, malvado, que obriga a gente a se esconder sob marquises, toldos, árvores; a aproveitar sombra de postes, resguardar o braço esquerdo na proteção da porta do carro, sob pena de acabar com um tostado e o outro cru...

Mesmo quando estamos a salvo dos raios diretos desse Sol perverso, ele nos incomoda e flagela. Eleva a temperatura a limites insuportáveis, faz tremelicar a paisagem, derreter o asfalto, esturricar os crânios, superaquecer o volante do ônibus, o painel do carro... Faz-nos suar a bicas, sentir-nos empapados, melados, grudentos.

Nas tardes típicas de verão, o suor abundante que escorre por dentro das roupas empoça e produz aquelas rodelas escuras que nos envergonham. Viramos verdadeiros bacons humanos de tanto suar e secar, suar e secar, suar e sacar. Acabamos o dia defumados!

Ah, no inverno o Sol é tão mais maneiro e consciencioso! É uma estação em que o inimigo severo vira amigo afetuoso. E assim o buscamos a todo o instante. Esse novo Sol, aliado, parceiro, nos ajuda a espantar o frio e compensar o vento gélido e cortante que nos surpreende pelas ruas. Que delícia seus raios outonais, que entram pela janela e aquecem o escritório frio, que iluminam suavemente um quarto, que matam os ácaros da noite úmida, que criam locais especiais para os animais domésticos, friorentos, se aconchegarem!

Saí de um cliente. Era uma dessas tardes frias. O Sol se insinuava no horizonte projetando incríveis lâminas alaranjadas pela cidade. O relógio do totem, fincado na ilha no centro da avenida, marcava 17h20. Dirigindo em busca da via principal que me tiraria do centro do bairro pouco conhecido, avistei, numa simpática rua de casas antigas, um charmoso e convidativo café. Parei. Não resisto a uma bela casa de cafés.

Pedi um capuccino e fui me sentar numa das mesinhas de madeira cobertas por toalhinhas, junto à calçada. O vento, apesar de suave, já incomodava um pouco na sombra, e avisava que a noite seria para edredons robustos. Minha jaqueta já não estava servindo para cortar o frio, mas eu havia escolhido a mesa certa, banhada pelo Sol. Por um instante até fechei os olhos, estiquei as pernas e quase cochilei, acariciado pelo calorzinho reconfortante.

Quando me dei conta, a xícara de capuccino já fumegava na minha frente, trazida pela atendente. Um cão de rua, desses sofridos, se ajeitou perto da mesa, compartilhando comigo, democraticamente, a mesma fatia de sol. Olhamo-nos. "Aceita um capuccino?" – perguntei – "Hoje eu pago!"

A atendente, que agora passava um paninho na mesa ao lado, me olhou com estranheza e voltou ao seu paninho. “Mais uma que não entende o prazer do sol do inverno” – balbuciei, e dei uma piscadela pro meu novo amigo, que, aquiescendo, pareceu me sorrir com os olhos.

Tradução - Eduardo Miranda

Ali Ahmad Said Asbar (em árabe: علي أحمد سعيد إسبر), nascido em 1 de Janeiro de 1930, também conhecido pelo pseudônimo Adonis ou Adunis (em árabe: أدونيس), é um poeta e ensaísta sírio que fez sua carreira em grande parte no Líbano e França, com mais de vinte livros em língua árabe. Adonis é um pioneiro da poesia árabe moderna. Ele é muitas vezes visto como um rebelde, um iconoclasta que segue suas próprias regras. Ganhou os prêmio Bjørnson (2007) e Goethe (2011).
Burqa, by radioegg

Entre Seus Olhos e os Meus
Ali Ahmad Said Asbar

Quando mergulho meus olhos nos seus olhos,
Percebo um parco amanhecer
Vejo também coisas de tempos passados
E vejo também coisas que não conheço
E sinto que o universo se posta
Entre os meus olhos e os seus

بين عينيك وبيني
علي أحمد سعيد إسبر

حينما أُغرقُ في عينيكِ عيني،
ألمح الفجر العميقا
وأرى الأمس العتيقا
وأرى ما لست أدري،
وأحسّ الكون يجري
بين عينيكِ وبيني.ـ

Foreign Words - Hamilton Faria




Agnes Trachet - Fenêtre Sur...
acrylique et encre sur papier

Browsing a Family Album
translated by Eduardo Miranda

Time tells me in a pause
from its memories
       and cause
               on this page
               wasn't happy I was?

Folheando um Álbum de Família

Tempo me diga me diz
Tu memória
e raiz       
nesta página               
fui feliz?               

Releitura - Ferreira Gullar


3 Gullares

Ferreira Gullar (José Ribamar Ferreira), nasceu no dia 10 de setembro de 1930, na cidade de São Luiz, capital do Maranhão, quarto filho dos onze que teriam seus pais, Newton Ferreira e Alzira Ribeiro Goulart. Estreou em poesia em 1949 com o livro Um Pouco Acima do Chão. Em 1951 transferiu-se para o Rio de Janeiro, onde começou a trabalhar como jornalista. As experimentações gráficas contidas em seu livro A Luta Corporal (1954) motivaram sua aproximação com os poetas paulistas Décio Pignatari e os irmãos Augusto e Haroldo de Campos, que lançariam mais tarde o movimento da poesia concreta (1956). Inicialmente, Gullar participou do movimento, mas afastou-se em 1959 para criar o grupo neoconcretista. No início dos anos 60, o poeta dedica sua poesia mais a temas sociais e ao engajamento político. Em 1964 filia-se ao Partido Comunista Brasileiro. Em 1971, com o recrudescimento da ditadura militar, partiu para o exílio (Rússia, Chile e Argentina), de onde retornou em 1977. Na Argentina, Ferreira Gullar escreveu o Poema Sujo, livro lançado em 1976, com o poeta ainda no exílio. Uma das vozes mais expressivas da poesia brasileira, a linguagem de Gullar vai além do horizonte das palavras, pois o poeta é também crítico de arte e pinta quadros, faz desenhos e colagens.
Traduzir-se

Uma parte de mim
é todo mundo:
outra parte é ninguém:
fundo sem fundo.

Uma parte de mim
é multidão:
outra parte estranheza
e solidão.

Uma parte de mim
pesa, pondera:
outra parte
delira.

Uma parte de mim
almoça e janta:
outra parte
se espanta.

Uma parte de mim
é permanente:
outra parte
se sabe de repente.

Uma parte de mim
é só vertigem:
outra parte,
linguagem.

Traduzir uma parte
na outra parte
— que é uma questão
de vida ou morte —
será arte?

Um instante

                    Aqui me tenho
                    Como não me conheço
                              nem me quis

                    sem começo
                    nem fim

                              aqui me tenho
                              sem mim

                    nada lembro
                    nem sei

                    à luz presente
                    sou apenas um
                    bicho
                              transparente

Cantiga para não morrer


Quando você for se embora,
moça branca como a neve,
me leve.

Se acaso você não possa
me carregar pela mão,
menina branca de neve,
me leve no coração.

Se no coração não possa
por acaso me levar,
moça de sonho e de neve,
me leve no seu lembrar.

E se aí também não possa
por tanta coisa que leve
já viva em seu pensamento,
menina branca de neve,
me leve no esquecimento.

Ilustração - José Geraldo de Barros Martins


Ilustração - Husam Rabahia




Husam Rabahia

Foto - Issa Touma

Issa Touma nasceu na (Síria, 1962) é um fotógrafo auto-didata. Em 1992 ele montou a primeira galeria de fotografia do Oriente Médio, a Galeria Preto e Branco. Fundou em 1997 o primeiro evento contemporâneo de fotografia do Oriente Médio, em Aleppo, na Síria. Desde 1999 ele organiza o Festival Internacional das Mulheres nas Artes, na Síria, um evento que reúne música, dança, teatro, escultura, fotografia, performance e vídeo.






Autores

Ademir Demarchi Adriana Pessolato Adília Lopes Afobório Agustín Ubeda Alan Kenny Alberto Bresciani Alberto da Cunha Melo Aldo Votto Alejandra Pizarnik Alessandro Miranda Alexei Bueno Alexis Pomerantzeff Ali Ahmad Said Asbar Almandrade Alyssa Monks Amadeu Ferreira Ana Cristina Cesar Ana Paula Guimarães Andrew Simpson Anthony Thwaite Antonio Brasileiro Antonio Cisneros Antonio Gamoneda Antonio Romane António Nobre Ari Candido Fernandes Ari Cândido Aristides Klafke Arnaldo Xavier Atsuro Riley Aurélio de Oliveira Banksy Bertolt Brecht Bo Mathorne Bob Dylan Bruno Tolentino Calabrone Camila Alencar Carey Clarke Carla Andrade Carlos Barbosa Carlos Bonfá Carlos Drummond de Andrade Carlos Eugênio Junqueira Ayres Carlos Pena Filho Carol Ann Duffy Carolyn Crawford Cassiano Ricardo Cecília Meireles Celso de Alencar Cesar Cruz Charles Bukowski Chico Buarque de Hollanda Chico Buarque de Hollanda and Paulo Pontes Claudia Roquette-Pinto Constantine Cavafy Conteúdos Cornelius Eady Cruz e Souza Cyro de Mattos Cândido Rolim Dantas Mota David Butler Denise Freitas Desmond O’Grady Dimitris Lyacos Dino Valls Dom e Ravel Donald Teskey Donizete Galvão Donna Acheson-Juillet Dorival Fontana Dylan Thomas Décio Pignatari Edgar Allan Poe Edson Bueno de Camargo Eduardo Miranda Eduardo Sarno Eduvier Fuentes Fernández Elaine Garvey Elizabeth Bishop Enio Squeff Ernest Descals Eugénio de Andrade Evgen Bavcar Fernando Pessoa Fernando Portela Ferreira Gullar Firmino Rocha Francisco Niebro George Callaghan George Garrett Gey Espinheira Gherashim Luca Gil Scott-Heron Gilberto Nable Glauco Vilas Boas Gonçalves Dias Grant Wood Gregório de Matos Guilherme de Almeida Hamilton Faria Henri Matisse Henrique Augusto Chaudon Henry Vaughan Hilda Hilst Hughie O'Donoghue Husam Rabahia Ian Iqbal Rashid Ingeborg Bachmann Issa Touma Italo Ramos Itamar Assumpção Iulian Boldea Ivan Donn Carswell Ivan Justen Santana Ivan Titor Ivana Arruda Leite Izacyl Guimarães Ferreira Jacek Yerka Jack Butler Yeats Jackson Pollock Jacob Pinheiro Goldberg Jacques Roumain James Joyce James Merril James Wright Jan Nepomuk Neruda Jason Yarmosky Jeanette Rozsas Jim McDonald Joan Maragall i Gorina Joaquim Cardozo Joe Fenton John Doherty John Steuart Curry John Updike John Yeats Josep Daústin José Carlos de Souza José Geraldo de Barros Martins José Inácio Vieira de Melo José Miranda Filho José Paulo Paes José Ricardo Nunes José Saramago José de Almada-Negreiros João Cabral de Melo Neto João Guimarães Rosa João Werner Junqueira Ayres Kerry Shawn Keys Konstanty Ildefons Galczynski Kurt Weill Leonardo André Elwing Goldberg Lluís Llach I Grande Lou Reed Luis Serguilha Luiz Otávio Oliani Luiz Roberto Guedes Luther Lebtag Léon Laleau Lêdo Ivo Magnhild Opdol Manoel de Barros Marco Rheis Marcos Rey Mari Khnkoyan Maria do Rosário Pedreira Marina Abramović Marina Alexiou Mario Benedetti Mario Quintana Mariângela de Almeida Marly Agostini Franzin Marta Penter Marçal Aquino Masaoka Shiki Maser Matilde Damele Matthias Johannessen Michael Palmer Miguel Torga Mira Schendel Moacir Amâncio Mr. Mead Murilo Carvalho Murilo Mendes Márcio-André Mário Chamie Mário Faustino Mário de Andrade Mário de Sá-Carneiro Nadir Afonso Nuala Ní Chonchuír Nuala Ní Dhomhnaill Nâzım Hikmet Odd Nerdrum Orides Fontela Orlando Gibbons Orlando Teruz Oscar Niemeyer Osip Mandelstam Oswald de Andrade Pablo Neruda Pablo Picasso Patativa do Assaré Paul Funge Paul Henry Paulo Afonso da Silva Pinto Paulo Cancela de Abreu Paulo Henriques Britto Paulo Leminski Pedro Du Bois Pedro Lemebel Pete Doherty Petya Stoykova Dubarova Pink Floyd Plínio de Aguiar Pádraig Mac Piarais Qi Baishi Rafael Mantovani Ragnar Lagerbald Raquel Naveira Raul Bopp Regina Alonso Renato Borgomoni Renato Rezende Renato de Almeida Martins Ricardo Portugal Ricardo Primo Portugal Ronald Augusto Roniwalter Jatobá Rowena Dring Rui Carvalho Homem Rui Lage Ruy Belo Ruy Espinheira Filho Ruzbihan al-Shirazi Régis Bonvicino Salvado Dalí Sandra Ciccone Ginez Santiago de Novais Saúl Dias Scott Scheidly Seamus Heaney Sebastian Guerrini Sebastià Alzamora Shahram Karimi Shorsha Sullivan Sigitas Parulskis Silvio Fiorani Smokey Robinson Sohrab Sepehri Sophia de Mello Breyner Andresen Souzalopes Susana Thénon Susie Hervatin Suzana Cano Sílvio Ferreira Leite Sílvio Fiorani The Yes Men Thom Gunn Tim Burton Tomasz Bagiński Torquato Neto Túlia Lopes Vagner Barbosa Val Byrne Valdomiro Santana Vera Lúcia de Oliveira Vicente Werner y Sanchez Victor Giudice Vieira da Silva Vinícius de Moraes W. B. Yeats W.H. Auden Walt Disney Walter Frederick Osborne William Kentridge Willian Blake Wladimir Augusto Yves Bonnefoy Zdzisław Beksiński Zé Rodrix Álvaro de Campos Éle Semog