Charles Baudelaire, L’Amour du mensonge - acrylic on canvas by Lu Xinjian |
Nascimento da escrita; nascimento do poema. Pesquisa semântica a partir da rasura, a imprecisão da escrita de punho. Corolário: deriva semântica. Leitor de lápis em punho que rubrica à margem do texto. A transposição do fônico para o háptico. Imagem que se materializa pela palavra. Pontos átonos, fortes e fracos. Un coup de dedos. O texto artístico não deixa transparecer em sua economia genésica toda a gama de vacilações, de lituras, ou até mesmo, de escarificações envolvidas no desentranhamento do neográfico no interior das convenções do discurso literário. Dado por embalsamado — como escreve João Cabral de Melo Neto num poema —, isto é, quando acaba num livro, aquilo que era febril e fabril resta apagado de uma vez por todas, vira música calada. O projeto Poema em foco nos lança sobre a superfície da materialidade textual onde deparamos esse esforço heurístico e quase que físico do escritor no corpo a corpo com a linguagem, na tentativa de reencenar a pulsão tanto indicial quanto icônica do verbal; essa “estranha esgrima”, metáfora escolhida por Baudelaire para representar o artesanato, a oficina irritada e irritante do escritor tatuando a folha incólume: Je vais m’exercer seul à ma fatasque escrime. Plongée. O gesto fotográfico simula o industrioso e ocioso trabalho de escrita de cada autor no encalço do melhor efeito de fundo-forma. Rosácea de pontos de vista. Fotogramas em close reading na superfície abrasiva dos anagramas. As fotografias não mostram mãos escrevendo. Mostram mãos pensando.
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