Orides de Lourdes Teixeira Fontela nasceu em São João da Boa Vista, interior de São Paulo, em 21 de abril de 1940. Começou a escrever poemas aos sete anos de idade. Aos 27 anos, deixou sua cidade natal e foi morar em São Paulo, com dois sonhos na cabeça: entrar na USP e publicar um livro. Cumpriu os dois, fez Filosofia e publicou seu primeiro livro, Transposição, com a ajuda do professor Davi Arrigucci Jr., seu conterrâneo. Publicou ainda Helianto (1973), Alba (1983, prêmio Jabuti de Poesia), Rosácea (1986), Trevo 1969-1988 (1988) e Teia (1996, prêmio da Associação Paulista de Críticos de Arte). Sempre com dificuldades financeiras, tinha uma personalidade atormentada que geralmente transparecia em sua poesia. Tal comportamento acabou afastando-a do convívio social e levou-a a viver na miséria. Orides quase foi enterrada como indigente na ocasião de sua morte, no dia 4 de novembro de 1998, aos 58 anos, de insuficiência cardiopulmonar decorrente de tuberculose, na Fundação Sanatório São Paulo, em Campos do Jordão. Sobre sua obra, Antônio Cândido escreveu: "Uma poesia diáfana, mas densa, alada e cheia de peso, onde um vocábulo como pássaro pode assumir significados da mais poderosa vitalidade; onde a pureza incontaminada de espelho pode virar signo de drama e tormento".
Philip Taaffe - Andalusian Panel I, 2008 |
Herança
Da avó materna:
uma toalha (de batismo).
Do pai:
um martelo
um alicate
uma torquês
duas flautas.
Da mãe:
um pilão
um caldeirão
um lenço.
[in De Rosácea, 1986]
Da avó materna:
uma toalha (de batismo).
Do pai:
um martelo
um alicate
uma torquês
duas flautas.
Da mãe:
um pilão
um caldeirão
um lenço.
[in De Rosácea, 1986]
Fala
Tudo
será difícil de dizer:
a palavra real
nunca é suave.
Tudo será duro:
luz impiedosa
excessiva vivência
consciência demais do ser.
Tudo será
capaz de ferir. Será.
agressivamente real.
Tão real que nos despedaça.
Não há piedade nos signos
e nem no amor: o ser
é excessivamente lúcido
e a palavra é densa e nos fere.
(Toda palavra é crueldade)
[Poesia Reunida (1969-1996)]
1 comment:
Em 1995, li na revista Veja pequena nota sobre a poesia de Orides. Recortei e guardei. No início de 2000, por acaso, tal recorte voltou-me às mãos. Fui atrás. Quanto mais a leio, mais apaixonado fico pela contundência de seus versos (não diáfanos), pela razão direta de suas palavras, pelo distanciamento dos signos e símbolos, pela singularidade. Abraços, Pedro.
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